Título: Homem de confiança de Dirceu conta que recebia Valério no Planalto
Autor: Rosa Costa e Lisandra Paraguassú
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/08/2005, Nacional, p. A10

BRASÍLIA - O ex-assessor da Casa Civil Marcelo Sereno negou ontem, em depoimento à CPI dos Bingos, que tratasse de quaisquer assuntos políticos enquanto estava no governo. Mas, pouco depois, admitiu que recebeu o empresário Marcos Valério - acusado de ser o operador do mensalão - duas ou três vezes na Casa Civil para tratar de campanhas políticas. A contradição chamou a atenção dos senadores e Sereno chegou a dizer que saiu do governo, em maio de 2004, para ter mais liberdade para tratar das campanhas do PT. Primeiro, Sereno - que admitiu ser homem de confiança do seu então chefe, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu - disse que nunca havia discutido assuntos de natureza política na Casa Civil e sua função limitava-se a encaminhar para os ministérios e estatais os nomes indicados por partidos. Pouco depois, no entanto, ao ser perguntado se conhecia Marcos Valério, confirmou que o recebera na Casa Civil.

"Ele tinha - ou tem - uma empresa com a qual queria entrar na área de marketing político e nós conversamos sobre isso. Ele sabia da minha influência na política do Rio de Janeiro e queria entrar nesse mercado", contou. "De fato, ele terminou por fazer a campanha do PT em Petrópolis", informou, dando a entender que o contrato aconteceu por sua influência.

O depoimento de Sereno durou mais de três horas e deixou os senadores frustrados. Armado com um habeas corpus preventivo que lhe permitiu não assinar o compromisso de dizer a verdade, Sereno negou praticamente tudo que lhe foi perguntado.

Em um determinado momento, quando foi explicar como comprou um apartamento de R$ 700 mil no Rio de Janeiro, um de seus advogados, Roberto Podval, tentou interromper o depoimento e quase foi retirado à força da sala da CPI. Os senadores reagiram com indignação à tentativa de interrupção - a lei diz que o depoente não pode receber instruções durante o depoimento.

EMPRÉSTIMOS

O assunto foi retomado mais tarde, e ele admitiu que "pode ter almoçado" com o publicitário. Informou, então, que não discutiu valores ou campanhas específicas, mas teve conversas "genéricas sobre política".

Sereno negou ter conhecimento de algum esquema com casas de bingo no Rio de Janeiro, conforme acusação do ex-secretário nacional de Segurança Luiz Eduardo Soares. Negou também que tenha sido o arrecadador da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Rio - outra das acusações feitas por Soares.

Outra de suas negativas foi que tivesse tido contatos freqüentes com Waldomiro no Rio de Janeiro. "Não tive nenhuma relação com a Loterj, nem durante o governo de Benedita no Rio nem depois. Me arrisco a dizer que talvez nunca tenha falado com Waldomiro durante aquele período", garantiu.

Os contatos mais freqüentes entre os dois só teriam começado na Casa Civil. Comentando esse período de atividade dos dois, Sereno classificou Waldomiro de "o termômetro do governo no Congresso". A respeito, afirmou: "Era ele quem recebia e classificava as emendas parlamentares e quem reclamava que os acordos não estavam sendo cumpridos, que os ministros não estavam fazendo o combinado", disse.