Título: Lula inova com Tesouro Direto
Autor: Adriana Fernandes
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/08/2005, Economia & Negócios, p. B4

Presidente inaugurou estilo 'talk show' para falar sobre modalidade de aplicação financeira

BRASÍLIA - Alheio à crise política, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu ontem espaço na agenda e inaugurou o estilo "talk show" para se informar sobre uma modalidade de aplicação financeira não muito popular: o chamado "Tesouro Direto". Trata-se da possibilidade de compra de títulos do Tesouro por meio da internet que alcançou, este mês, a marca dos R$ 1 bilhão em operações desde que foi criado no governo Fernando Henrique Cardoso. Lula conversou com o secretário do Tesouro, Joaquim Levy, e aproveitou para fazer propaganda e incentivar os brasileiros a comprarem títulos da dívida interna. Lula cobrou do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, recursos para uma campanha de divulgação do programa, de forma a incentivar os pais a comprarem títulos de 20 anos para os filhos.

"Pode ser uma boa coisa para os pequenos poupadores. Os grandes já sabem como fazer. Pode ser algo surpreendente para que o povo guarde o dinheiro e faça o investimento com toda garantia", disse o presidente. A apresentação na forma de entrevista foi aberta à imprensa, um momento raro do governo Lula.

Descontraído, o presidente disse que a expansão do programa para todos os brasileiros tornará a dívida pública menos vulnerável às oscilações do mercado. Afirmou ser possível que um dia metade dos títulos da dívida - hoje em R$ 915,67 bilhões - seja vendida pelo Tesouro Direto. A maior parte dos papéis da dívida é comprada pelos bancos, para compor a carteira dos fundos de investimento.

"Quem sabe um dia um seringueiro, ao vender a sua borracha no Acre, compre títulos de 5 anos. Vamos estar mais garantidos do que ficar apenas na mão do curto prazo, como estamos hoje", disse Lula - os bancos preferem papéis com prazo de vencimento mais curto e os compradores do Tesouro apostam em prazos mais longos.

O secretário do Tesouro respondeu a quatro perguntas do presidente, uma delas sobre o risco de o Tesouro Direto comprometer recursos aplicados na poupança. Levy disse que não há esse risco e que o Tesouro Direto é uma aplicação que concorre mais com os fundos de investimentos. O presidente também quis saber se o programa não acabava com a função de "atravessador" que os bancos exercem junto aos aplicadores e revelou que, em conversa sobre o Tesouro Direto com um banqueiro, este lhe disse que o programa "não era interessante".

BANCOS

Levy aproveitou a deixa para fazer uma crítica indireta aos grandes bancos que ainda não trabalham interligando pela Internet o Tesouro Direto à rede de clientes deles. "Tem bancos que são muito animados. Mas tem outros que são um pouco menos e que só gostam de deixar para os clientes ricos que colocam muito dinheiro", reclamou o secretário.

O secretário revelou ainda que tesoureiros de bancos pedem para aumentar o limite de aplicação do Tesouro Direto para que possam investir mais o seu próprio dinheiro. Levy chegou a dizer que há fundo de investimento "burro", sem, no entanto, explicitar quais estariam nessa classificação.

Desde o início da implantação do Tesouro Direto, os bancos resistiram à idéia por entenderem que o programa, a longo prazo, pode se transformar em um concorrente aos fundos de investimentos e até mesmo aos produtos de previdência privada que eles mantêm. Há bancos que exigem aplicação mínima de R$ 25 mil dos clientes para fazer a aplicação no Tesouro Direto.

Segundo o secretário, a NTN-F (título prefixado com pagamento de juros semestrais) com prazo de vencimento em janeiro de 2008 é o papel que nos últimos 12 meses garantiu a maior rentabilidade aos investidores: 19,86%. As LTNs (títulos prefixados) com prazo de vencimento em janeiro de 2006 deram uma rentabilidade de 17,48%. A rentabilidade das LFTs (papéis corrigidos pela taxa Selic) variou entre 18,8% e 19,9%.