Título: Para Chico de Oliveira, luta interna é `guerra de gangues¿
Autor: Ubiratan BrasilRoldão Arruda
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/08/2005, Nacional, p. A12

BELO HORIZONTE - A disputa entre o presidente interino do PT, Tarso Genro, e o deputado José Dirceu (SP) pelo comando do partido se assemelha a "uma guerra de gangues" e "tem tudo para dar errado". A opinião foi expressada pelo sociólogo e professor da Universidade de São Paulo (USP) Francisco de Oliveira, em palestra na noite de ontem. Ao abrir o ciclo de conferências "O silêncio dos intelectuais", em Belo Horizonte, Oliveira - que é fundador do PT, mas se desligou da legenda em 2003 - fez previsões pessimistas sobre o partido. "O PT está se aproximando, perigosamente, de uma luta de vale-tudo. Vale qualquer coisa desde que seja para eliminar o adversário. É um perigo. Com esse núcleo dirigente, o PT pode desaparecer." Para uma platéia de cerca de 170 pessoas, que lotou o Centro Cultural da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o sociólogo chegou a dizer que o seu objetivo não era "discutir muito o governo". Mas ao responder à pergunta de um espectador - se há saída para a crise do PT com a manutenção do comando do partido com o Campo Majoritário -, ele foi direto. "Só se eu fosse tolo de pensar que, com o núcleo dirigente que fez o que fez, tem saída par o PT. Evidentemente não tem."

"Tem tudo para dar errado. Tem tudo para transformar o PT num partido de gangues. O que seria uma tragédia não só para o partido, mas para a sociedade brasileira", observou. "Não estou exagerando, tem a gangue do ex-tesoureiro, a gangue do ex-secretário, a gangue do publicitário", disse, arrancando risos dos presentes. Na sua avaliação, a eleição para o novo Diretório Nacional é a chance de a militância petista tirar a atual direção. Para ele, nos últimos anos o PT se afastou de sua base e se aproxima e se compara ao peronismo.

O professor da USP destacou que uma das grandes "novidades" do PT para a política brasileira foi a campanha pela ética, uma "contribuição original", que teve influência na proximidade com a chamada ala progressista da Igreja Católica.

"É por aí que veio essa influência, essa exigência de transparência e rigor, da qual o PT foi nos anos da democratização o maior arauto", disse Oliveira. "Será uma perda se isso submergir na crise."

INTELECTUAIS

Oliveira comentou, em entrevista antes da palestra, que o partido do presidente Lula trocou um projeto de nação por um de poder. Afirmou que o "grande erro" da cúpula partidária foi promover uma virada à direita e "descolar-se das bases". Para ele, é um comportamento "fatal" para um partido de esquerda.

O PT, segundo Oliveira "adotou as teses do adversário". "Em determinado momento, o partido faz uma virada e estrutura-se para um projeto de poder. E no governo só mira isso", anotou. O professor da USP defendeu o papel dos intelectuais brasileiros no processo histórico da política nacional.

Na sua opinião é equivocada a afirmação de que os intelectuais estão calados no atual momento de crise política. "Existe uma intensa movimentação hoje. O que faz falta, na verdade, é uma nova idéia central", ressaltou.

Oliveira acrescentou que não concorda com a declaração da filósofa Marilena Chaui, que, no Rio, na abertura do mesmo ciclo de palestras, defendeu o direito dos intelectuais ao silêncio em tempos de crise. "Estou do lado oposto. Os intelectuais têm obrigação de falar", provocou. "O dever deles é falar, é fazer a crítica permanentemente, justamente agora".