Título: Sob holofotes da CPI, Dantas quer deixar a telefonia
Autor: Fernando Dantas
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/08/2005, Nacional, p. A12

No momento em que é convocado para as CPIs dos Correios e do Mensalão, o financista Daniel Dantas, dono do Opportunity, empresa de gestão de recursos, está decidido a abandonar o setor de telefonia, garantem seus colaboradores mais próximos. Para isto, além de tentar manter o acordo, suspenso na Justiça de Nova York, de venda de sua parte na Brasil Telecom, empresa de telefonia fixa do Sul e Centro-Oeste, para a Telecom Italia, ele quer vender o mais rápido possível a mineira Telemig Celular - o que os fundos de pensão de estatais, seus grandes inimigos, afirmam não ser possível. A gota d'água para que Dantas abandonasse o sonho de controlar a Brasil Telecom foram os pedidos de prisão contra ele no ano passado e início deste, em função do caso de espionagem pela telefônica brasileira da Telecom Italia e de políticos e autoridades - o que incluiu a interceptação de e-mails do atual secretário especial do Núcleo de Assuntos Estratégicos (NAE), Luiz Gushiken, maior adversário do Opportunity no governo Lula.

Como a Telemig Celular e a Amazônia Celular, cuja gestão ainda é controlada pelo Opportunity, fizeram repasses de R$ 145 milhões às contas da DNA e SMPB, agências de publicidade de Marcos Valério, ao longo de pouco mais de quatro anos, surgiu a hipótese de que Dantas pudesse ser um abastecedor do "valerioduto", em troca de suposta defesa de seus interesses por parte do ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu. As empresas, porém, dizem que aqueles valores são consistentes com suas necessidades publicitárias, e a maior parte dos recursos teve anunciantes como destino final, só ficando R$ 15 milhões nas agências.

A disputa entre o Opportunity e as fundações é o último capítulo da história complexa das aplicações conjuntas na privatização de dois fundos de investimento criados em 1997, e administrados até recentemente pela empresa de Dantas. Um dos fundos é internacional, e tem como principal sócio o Citigroup. O outro é nacional, e tem como cotistas basicamente um conjunto de grandes fundos de pensão de estatais, liderados pela Previ (Banco do Brasil), Funcef (Caixa Econômica) e Petros (Petrobrás).

A partir de 1998, aqueles dois fundos de investimentos adquiriram o controle da Brasil Telecom, Telemig Celular, Amazônia Celular, Metrô do Rio, um terminal no Porto de Santos, além de participações minoritárias na Companhia de Saneamento do Estado do Paraná (Sanepar) e Telemar.

Mais tarde, outros sócios entraram em algumas daquelas empresas, como a Telecom Italia no caso da Brasil Telecom. Os fundos foram organizados de tal forma que o Opportunity, mesmo com uma participação ínfima no capital das empresas, detinha o poder de controlar sua gestão, por meio de estruturas societárias complexas e uma teia de acordos. Desde os primeiros anos, Dantas enfiou-se em muitos conflitos complicadíssimos com praticamente todos os seus sócios no conjunto de empresas.

Hoje, a briga polarizou-se, e seu principal palco é a Brasil Telecom. De um lado, estão o Opportunity e a Telecom Itália. Do outro, os fundos e o Citi. Antes, ao fim de longas disputas judiciais, o Opportunity foi destituído tanto da gestão do fundo nacional, em 2003, quanto do internacional, em 2004. Isto significa que o Opportunity perderá a gestão das empresas, embora este processo tome algum tempo. É por já estar em processo de remoção que as suas decisões atuais nas empresas são questionadas, como a venda da Telemig Celular, que as fundações dizem não aceitar.

É provável que a Brasil Telecom mude sua atual estrutura societária, para um desenho mais estável e definitivo. Os quatro protagonistas lutam para não levar desvantagem financeira neste processo. Enquanto a Telecom Italia fez acordo para comprar a parcela do Opportunity, as fundações acertaram-se com o Citi para venderem suas partes juntos. Se não sair a venda conjunta, os fundos comprometem-se a comprar a participação do Citi até 2007.

O acerto está barrado por liminar. A alegação é de que o preço de R$ 1 bilhão que os fundos comprometeram-se a pagar ao Citi corresponde a três vezes o valor atual das ações da Brasil Telecom. As fundações, porém, argumentam que há várias outras cláusulas vantajosas no acordo, e que o preço está compatível com outras ofertas feitas recentemente por nacos da Brasil Telecom - inclusive a da venda da parte do Opportunity para a Telecom Italia. "O acordo recupera o valor dos nossos investimentos", diz Sérgio Rosa, presidente da Previ.

Segundo algumas fontes, Dantas - visto como vinculado a políticos do PFL, especialmente da Bahia, seu Estado natal - teria tentado criar canal no governo, para defender seus pleitos, junto a Dirceu. O caminho teria sido via Valério. No Opportunity, a versão é que Dirceu, em três encontros com Dantas, apenas defendeu a posição de que o investidor deveria sair da gestão do fundo de investimento nacional.

O encontro este ano de Valério com um ex-ministro português em Lisboa, ligado a Portugal Telecom, despertou suspeitas, já que um dos candidatos a comprar a Telemig Celular é a Vivo, da empresa portuguesa e da espanhola Telefónica. As negociações com a Vivo coincidem aproximadamente com a ida de Valério e um ex-tesoureiro do PTB a Lisboa, em janeiro. Há teorias comprometedoras para o Opportunity ou para o governo sobre a viagem de Valério a Portugal, mas os que as levantam reconhecem que são conjecturas.