Título: Bancos já buscam alternativas para compensar taxa de juro mais baixa
Autor: Márcia De Chiara
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/08/2005, Economia & Negócios, p. B1

Balanços do 1.º semestre revelam esforço para cortar despesas, ampliar carteiras de crédito e vender mais produtos e serviços

Os bancos avançam para enfrentar os novos tempos que se avizinham com a taxa básica de juros menor do que os atuais 19,75% ao ano, especialmente agora que o Banco Central (BC) indica que poderá começar a reduzir a Selic a partir do mês que vem. O esforço para ampliar as carteiras de crédito, vender mais produtos e serviços financeiros e, principalmente, reduzir despesas apareceu nos balanços do primeiro semestre deste ano, que exibiram lucros recordes. Na média dos quatro maiores bancos do País - Bradesco, Itaú, Unibanco e Banco do Brasil -, o ganho com serviços foi o componente da receita total que mais cresceu entre janeiro e junho deste ano em relação a igual período de 2004, afirma Luiz de Castro Prado, analista financeiro do Instituto de Ensino e Pesquisa em Administração (Inepad), autor de um estudo sobre o setor no semestre. Ele pondera que a receita com as operações de crédito ainda é o alicerce dos lucros. "Essa é a principal fonte e não há perspectivas de mudanças."

Segundo o estudo, juntos, os quatro maiores bancos em ativos embolsaram R$ 13,8 bilhões com a venda de produtos e serviços financeiros e o aumento da população bancarizada, aquela que nunca tinha entrado numa agência desfrutando o status de cliente. O acréscimo nominal da receita foi de 34,7% na comparação com o primeiro semestre de 2004. No mesmo período, a receita total desses quatro bancos aumentou 4,9%, abaixo da inflação de 7,1% acumulada no período de 12 meses até junho pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

Quem puxou a fila na ampliação dos ganhos com serviços foi o Unibanco, que praticamente dobrou essa receita no período (99,9%), seguido pelo Itaú (27,5%), Bradesco (27%) e Banco do Brasil (15,7%).

Do bolo de uma receita total de R$ 58,7 bilhões no semestre passado acumulado pelas quatro instituições financeiras, a fatia dos ganhos com serviços foi a única que cresceu: de 18,5% no primeiro semestre de 2004 para 23% no mesmo período deste ano. Já a participação da receita de crédito na receita total passou de 47,5% no primeiro semestre de 2004 para 45% em igual período deste ano e a fatia dos ganhos de tesouraria teve um ligeiro recuo, de 34% para 33%, mesmo com a trajetória ascendente da Selic desde setembro de 2004.

"A visão de que o juro elevado é fundamental para os bancos está equivocada. Quando a taxa cai e a economia entra em ritmo de estabilidade surgem várias oportunidades de aumento de crédito com qualidade de recebimento", observa o vice-presidente do Bradesco, Miltom Vargas.

Além da ampliação da carteira de crédito - que, no caso do Bradesco, contribuiu com sua receita para 34% do lucro líquido da instituição apurado no primeiro semestre deste ano -, Vargas destaca as oportunidades que surgem para a venda de itens específicos.

As receitas com seguros, por exemplo, responderam por 30% do lucro da instituição no primeiro semestre, seguidas pelos ganhos com serviços (25%) e operações de tesouraria que envolvem a compra e venda de títulos públicos e privados (11%).

"Realmente os serviços melhoraram, com aumento da base de clientes por meio da compra de vários bancos e o fechamento de parcerias com varejistas", diz o vice-presidente do Bradesco. Na sexta-feira, o Bradesco anunciou mais três parcerias com lojas de varejo (Eletrozema, Dudoni e Grupo Ponte Irmãos) para financiamento ao consumo.

A intenção é ampliar a carteira de crédito e aproveitar a parceria para vender produtos e serviços do banco. Com essas três, ao todo já foram sete parcerias com lojas desde o segundo semestre do ano passado. Em três anos, o banco quer deter 50% das parcerias com o varejo. Dos 16,4 milhões, 1 milhão de clientes foram incluídos pelo processo recente de bancarização.

DESPESAS

"Já começamos a nos preparar para um cenário de juros baixos", afirma o gerente de Relações com Investidores do Banco do Brasil, Marco Geovanne. Além do aumento da receita com serviços e crédito, o foco da instituição foi cortar despesas. A redução dos gastos totais no primeiro semestre deste ano em relação a igual período de 2004 foi de 4%. As despesas com pessoal encolheram 1,6% no período e as outras despesas administrativas recuaram 7%.

Pela primeira vez, o índice de eficiência anualizado no segundo trimestre deste ano ficou abaixo de 50%. No primeiro trimestre, o indicador estava em 52%. Geovanne explica que o indicador mede as despesas em relação às receitas operacionais. Quanto menor, melhor.

Além da redução das despesas, o executivo do Banco do Brasil destaca que a instituição deu maior ênfase ao crédito, especialmente aquele com desconto em folha de pagamento, que responde por 14% da carteira de pessoa física e cresceu 146% em 12 meses até junho, com saldo da carteira de R$ 2,6 bilhões. "Queremos fechar o ano com R$ 4 bilhões e liderar o mercado."

Geovanne lembra também o interesse do banco em ampliar as receitas com produtos e serviços, como seguros, títulos de capitalização e planos de previdência privada, para compensar a queda dos juros. "Os bancos têm a capacidade de mudar o mix de produtos para se adequar à nova realidade, algo que é bem mais complicado no caso da indústria", ressalta.

A opção do Itaú na mudança de mix também foi pelo crédito, especialmente ao consumidor. No primeiro semestre deste ano, a carteira de crédito destinado a pessoas físicas aumentou 25% na comparação com dezembro de 2004, enquanto o financiamento a pequenas e médias empresas aumentou 12% e para as grandes companhias praticamente se manteve.

"Com a perspectiva maior de crescimento do País, a demanda por crédito vai aumentar", diz o diretor-executivo de Controladoria do Itaú, Sílvio Carvalho. Ele observa, no entanto, que, incluindo a expansão de novos negócios no setor de crédito, os custos da instituição aumentaram 12,7% no primeiro semestre deste ano em relação ao mesmo período de 2004.

Prado, do Inepad, lembra que é importante observar em quanto as receitas com serviços são suficientes para cobrir as despesas estruturais das instituições financeiras. No primeiro semestre de 2004, por exemplo, as receitas com serviços davam conta de 61% das despesas para os quatro bancos analisados. "No primeiro semestre deste ano, a média está em 77% e a tendência é de alta."