Título: Presos mais de 100 piratas da internet
Autor: Vannildo Mendes e João Unes
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/08/2005, Metrópole, p. C3

Após quatro meses de investigações, a Polícia Federal conseguiu desmontar ontem a maior quadrilha de hackers em atuação no País, especializada em usar a internet para desviar dinheiro de contas bancárias. Na Operação Pegasus, a PF deteve mais de cem pessoas em sete Estados e no Distrito Federal. A maior parte em Goiânia, sede do bando, que teria causado prejuízos de R$ 100 milhões. Para prender os hackers, a PF começou a trabalhar de forma simultânea logo nas primeiras horas da manhã em Goiás, Pará, Tocantins, Maranhão, Espírito Santo, Minas e São Paulo, além do DF. Foram mobilizados 410 policiais para cumprir 126 mandados, entre buscas, prisões temporárias e preventivas, expedidos pela 5ª Vara da Justiça Federal de Goiás.

Em Goiânia, pelo menos 85 pessoas foram detidas. O movimento no prédio da PF era tão grande pela manhã que a rua teve de ser fechada para dar passagem aos carros da polícia. Muitos hackers chegaram já algemados. Em seguida, vieram advogados e parentes dos presos, que lotaram o saguão e a entrada da PF.

RIO PRETO

No interior paulista, em São José do Rio Preto, agentes da PF prenderam mais cinco integrantes da quadrilha, que estavam hospedados em uma pensão e num flat no centro. Foram apreendidos três carros, uma motocicleta, computadores, celulares e documentos falsos.

A PF suspeita que um preso seja um dos líderes do bando. Os agentes informaram ainda que os detidos coordenavam a ação de uma outra célula da quadrilha, na cidade de Santa Fé do Sul, na divisa com Mato Grosso do Sul, onde outros dois homens foram presos.

A polícia não divulgou o nome de nenhum dos acusados, mas disse que alguns eram velhos conhecidos. Presos em operações anteriores, como Cash Net (2001) e Cavalo de Tróia 1 (2003) e 2 (2004), eles foram soltos e se agruparam para formar em Goiânia uma organização bem mais potente. As fraudes atingiram correntistas de quase todos os bancos do País.

A quadrilha usava o programa conhecido como cavalo de Tróia ou trojan para descobrir a senha bancária de correntistas. Depois, fazia débitos de três formas: transferência para laranjas, que alugavam suas contas por até R$ 500,00; compra de produtos e serviços; pagamento de boletos diversos. Já há indícios do uso desses programas, criados pela quadrilha no Brasil, em países como Estados Unidos e Venezuela.

E-MAIL

O bando usava e-mails falsos para ter acesso aos dados das vítimas. Eles enviavam mensagens falando sobre possíveis invasões de contas, irregularidades na Receita Federal e também sobre o cadastramento no registro de inadimplentes do Serasa. Nessas mensagens, os bandidos pediam que a pessoa digitasse seus dados bancários, incluindo a senha.

Outra forma comum era a criação das chamadas páginas clone das instituições bancárias, para onde os usuários são direcionados quando tentam acessar a página do seu banco. Nos dois casos, as informações eram repassadas para um servidor ou a caixa de e-mails dos criminosos.

Ainda segundo as investigações, os bandidos tinham uma estrutura bem organizada para realizar as fraudes. Programadores criavam as páginas clonadas, as mensagens eletrônicas e os programas. Já os chamados usuários enviavam diariamente milhares de e-mails à procura de novas vítimas.

Havia também os carteiros, biscoiteiros ou cartãozeiros, que faziam a arrecadação dos boletos bancários para quitação via internet, em troca de algum desconto. Quem pagou dívidas dessa forma também está sendo investigado pela PF, assim como os laranjas, que alugaram suas contas para que a quadrilha pudesse realizar transferências, pagamentos e saques fraudulentos.

Essa é a primeira grande operação feita pela nova Divisão de Repressão a Crimes Cibernéticos da PF. As penas dos detidos podem chegar a 8 anos.

O advogado Renato Opice Blum, especialista em direito eletrônico, disse ontem que o País vem se destacando na punição de ações criminosas pela internet. "Já há mais de 3 mil decisões judiciais sobre o tema", afirmou. Numa delas, de 2004, foi traçado até um organograma dos bandos (Veja ao lado).

Sobre a impressão de que os suspeitos desses crimes não ficam presos, Blum disse que a prisão preventiva, sem prazo, tem sido usada para os chefes e os usuários dos programas, por representarem uma ameaça à população. "Mas os laranjas geralmente são soltos."

SEGURANÇA

Nos últimos quatro anos, o número de clientes que usam internet banking passou de 8,3 milhões para 18 milhões, conseqüência não só da divulgação das facilidades do serviço como de maciços investimentos em tecnologia. Segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), em 2004 foram investidos R$ 4,2 milhões em tecnologia, 32% a mais que em 2002.

A entidade, no entanto, não oferece nenhuma orientação aos bancos para prevenir fraudes pela web. Esse cuidado acaba sendo de responsabilidade de cada instituição financeira.