Título: 'Não farei o que fizeram Getúlio, Jânio e João Goulart', diz Lula
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/08/2005, Nacional, p. A4

BRASÍLIA - Depois de mais de três meses de desgaste, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiu ontem abertamente a gravidade da crise política que está corroendo seu governo. Num dos mais marcantes pronunciamentos de todo seu mandato, Lula declarou que não repetirá o presidente Getúlio Vargas, que se matou há 51 anos, nem Jânio Quadros, que renunciou em 1962, nem João Goulart, deposto em 1964. Disse que pretende seguir o exemplo de Juscelino Kubitschek, que governou entre 1956 e 1961. "Uma crise, neste país, levou o Juscelino a ser mais achincalhado do que qualquer outro presidente da história do Brasil. Hoje, é exemplo para todos os presidentes de direita e de esquerda, de centro ou não", afirmou Lula. "Não farei o que fez o Getúlio Vargas, nem farei o que fez o Jânio Quadros, nem farei o que fez o João Goulart. O meu comportamento será o que teve o Juscelino Kubitschek: paciência, paciência e paciência, porque a verdade prevalecerá", disse.

Sem citar nome, Lula fez referência a Fernando Collor, que sofreu impeachment. "Jânio Quadros, ou melhor, João Goulart foi obrigado a renunciar. Eu estou dizendo esses nomes, não vou dizer o mais recente, para dizer uma coisa: eu sou um homem da consciência muito tranqüila, não apenas pelo meu passado, mas pelo meu futuro."

Lula discursou por mais de 40 minutos, ao participar de uma reunião do Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES). Nele, reúnem-se representantes de empresários, trabalhadores, entidades religiosas e sociais, grupos minoritários e ONGs.

O presidente abriu o discurso lendo o texto preparado, mas logo enveredou pelo improviso, reforçado por golpes com o punho direito no púlpito, nos trechos que pretendia enfatizar. Sua declaração de que não governa em função da reeleição, em 2006, foi uma das que mereceram pancada no púlpito.

Lula relatou que lera nos jornais que a condição básica para acabar com a crise seria não se lançar candidato e ouvira alguém dizer que melhor opção seria "sangrá-lo até levá-lo para uma sessão de hemodiálise". "Isso não me incomoda, sou democrata."

"Não é uma eleição que faz a minha cabeça. O que faz a minha cabeça é chegar em 31 de dezembro de 2006 e pedir para vocês fazerem uma aferição dos últimos 15 anos", completou.

Afirmou que compreende a ansiedade e a angústia dos que cobram a prisão dos envolvidos em corrupção. Mas acentuou que levará adiante as investigações que cabem ao governo, sem interferir nas de outros órgãos e CPIs. Ele destacou que, ao fim de todas as apurações, não poderá garantir que a corrupção será eliminada, pois se trata de "doença impregnada no comportamento de alguns seres humanos".