Título: Doenças e barreiras sanitárias tiram o sono dos citricultores
Autor: Gustavo Porto
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/08/2005, Economia & Negócios, p. B21

O iminente impacto comercial das doenças nos pomares e as barreiras sanitárias impostas às exportações brasileiras preocupam mais a cadeia produtiva de cítricos que as barreiras tarifárias impostas pelos Estados Unidos. As 200 mil plantas contaminadas com a doença greening e ainda não erradicadas, além de uma auditoria realizada por uma missão sanitária da União Européia, que percorreu nesta semana pomares paulistas, são considerados hoje os principais problemas do setor. A decisão do Departamento de Comércio dos Estados Unidos de aplicar tarifas antidumping sobre o suco de laranja concentrado e congelado brasileiro, que podem variar de 24,62% a 60,29%, é considerada ruim, mas não deverá impactar o mercado na safra 2005/06, cujo cenário é de oferta restrita e demanda em alta.

Relatado há um ano no Brasil, o greening, ou huanglongbing, já atingiu pomares de citros de 65 municípios paulistas, em praticamente todas as regiões de um parque comercial com quase 300 milhões de árvores. As quase 200 mil árvores contaminadas estão principalmente na região de Araraquara (SP) e, por lei, deveriam ser erradicadas.

Apesar de representarem apenas 0,6% do total de plantas, as árvores doentes não erradicadas são potenciais transmissoras da principal doença da citricultura, segundo o pesquisador e diretor do Centro de Citricultura Sylvio Moreira, Marcos Antonio Machado. "A ação (do greening) é muito rápida e podemos perder o controle em um ano, se não houver a erradicação. Não tem cura e não há variedade resistente à doença", diz Machado.

O centro de pesquisa, ao lado do Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), é responsável pela confirmação de novos casos de greening. Machado alerta ainda que produtores, por estarem em plena colheita, relutam em erradicar plantas contaminadas. "Eles querem esperar e descumprem a lei."

A missão sanitária da União Européia encerra hoje a auditoria feita no parque citrícola paulista com uma reunião na sede do Fundecitrus, em Araraquara. Um dos principais importadores de laranja de mesa e de suco do Brasil, o mercado europeu impõe sistematicamente barreiras contra a fruta fresca do País. A alegação é a possível contaminação das frutas locais com a pinta preta, doença comum no Brasil, mas exótica nos pomares europeus.

Há um ano, uma comissão semelhante visitou o Brasil e apontou falhas no processo brasileiro de certificação fitossanitária de citros, não reconheceu o processo de redução de riscos no controle de pragas adotado nos pomares comerciais do País e rechaçou citricultores reincidentes no envio de cargas com frutas com a pinta preta. A nova visita da missão européia avalia se os pedidos feitos no relatório foram cumpridos e, a exemplo da anterior, tem por objetivo normalizar o tenso comércio da laranja de mesa entre Brasil e União Européia.

Paralelamente, a indústria de suco de laranja brasileira inicia o período de "sintonia fina" com o governo americano até que seja ratificada, ou não, a tarifa antidumping imposta provisoriamente pelo Departamento de Comércio dos EUA sobre o suco brasileiro.

Na avaliação do presidente da Associação Brasileira dos Exportadores de Cítricos (Abecitrus), Ademerval Garcia, a tarifa é uma sobretaxa sobre o suco brasileiro, que já paga US$ 418 por tonelada para entrar no mercado americano. Com a taxação ultrapassando de US$ 600 por tonelada, ou 75% sobre os US$ 800 do preço médio de custo, as exportações para o mercado americano devem cair das 212 mil toneladas de suco de laranja na safra 2004/05 para, no máximo, 150 mil nesta safra. "Como as safras na Flórida e no Brasil vão ser menores neste ano e os estoques estão baixos aqui, (o antidumping) não afeta a nossa vida neste ano, mas isso pode mudar em 2006", disse Garcia.

A Abecitrus estima que a indústria irá processar entre 250 milhões e 260 milhões de caixas de 40,8 kg em 2005/06, o que confirma uma oferta ajustada à demanda. Mas, para o executivo, o maior problema ainda é a desvalorização do dólar "justamente no momento em que são necessários investimentos para suprir a demanda tecnológica gerada pelas pragas nos pomares".

Já o presidente da Associação Brasileira de Citricultores (Associtrus), Flávio Viegas, também afirma que não há uma preocupação imediata com a taxação do suco porque, na opinião dele, o mercado americano ainda tem uma forte demanda pelo produto brasileiro, após a quebra na safra local com os furacões que atingiram a Flórida, no ano passado.

"Eles vão precisar de suco e, provavelmente, pagarão o que o mercado está demandando", disse Viegas. Mas ele teme que a indústria reduza o preço pago aos produtores brasileiros para compensar o antidumping. "Reduzir preços pagos aos produtores brasileiros é terrorismo. Se o produtor for prejudicado, eu vou gritar alto."