Título: 'Cadê o Dirceu? O Genoino? Silvinho?', cobra Valério
Autor: Expedito Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/08/2005, Nacional, p. A7

O empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, apontado como operador do suposto mensalão pago pelo PT aos partidos aliados, está se sentindo abandonado pela cúpula do partido e avalia que apenas ele próprio e o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares serão responsabilizados pelo escândalo que abalou o governo. "Como disse um jornalista, minha vida virou um molambo. Eu virei um molambo. Fui usado e abandonado pelo PT, um partido de pessoas sem coração. Somente eu e Delúbio somos responsabilizados por tudo. Cadê o José Dirceu? O José Genoino? O Silvinho Pereira? O Antonio Palocci? Todos sumiram e só se fala em Marcos Valério como o responsável por tudo. Estão preparando uma pizza", desabafou ao Estado.

Um de seu advogados, que acompanhou parte da conversa de quase duas horas, chegou a lembrar que nessa pizza Marcos Valério seria "mussarela e Delúbio Soares o tomate". Depois de concordar, o empresário contou que tem uma raiva profunda por todos os dirigentes dos PT, com exceção de seu amigo Delúbio Soares, de cuja fidelidade ele teria sido testemunha .

"Delúbio não conta tudo o que sabe porque é um idiota. Ele tem uma fidelidade canina e é o único por quem eu tenho amizade. Mas eu tenho raiva do PT e gostar do Delúbio e odiar o PT pode parecer um paradoxo. Mas o Delúbio foi afastado, expulso e, como eu, abandonado", disse, afirmando equivocadamente que Delúbio foi expulso do partido.

Ao se referir ao que Delúbio poderia acrescentar à efervescente crise, Valério prefere dizer que o ex-tesoureiro não fez nada sem a ordem e orientação do ex-ministro José Dirceu. Mas ao ser provocado para responder olhos no olhos se havia alguém acima do ex-ministro que também sabia de tudo, o empresário se esquiva. "Sobre isso eu não falo porque não quero mentir, então, não vou olhar", escapou. "Só a verdade me libertará", acrescentou, lembrando de um preceito bíblico.

Em seu desabafo, no escritório de seu sócio Rogério Tolentino em Belo Horizonte, Valério contou que não revelou tudo o que ouviu de Delúbio, desde que os dois começaram a trabalhar juntos. Fez isso a pedido do próprio ex-tesoureiro, que sempre ponderou para a necessidade de preservar o partido. "O Delúbio veio aqui a Belo Horizonte e pediu para botar panos quentes em relação ao PT", contou.

AMBIÇÃO

Valério diz que errou por ambição desmedida, já que imaginava tornar-se um dos grandes nomes da publicidade nacional. "Eu fui imbecil e fiz uma imbecilidade. Eu achava que era a hora de a minha empresa, a SMPB, ficar tão poderosa quanto as empresas de Duda Mendonça e de Nizan Guanaes. Eu pensava ter uma grande filial em São Paulo, pensava que tinha chegado a minha vez. Fui um imbecil e tudo deu errado."

Segundo ele, até mesmo seus sócios, que sempre lhe renderam elogios pela aproximação da SMPB com o PT e não dispensavam a participação na divisão de lucros, também desapareceram. De barba malfeita e sem os ternos bem cortados que exibia em Brasília, durante os depoimentos nas CPIs, Valério acha que 2005 vai ser o ano em que a história registrará de forma negativa sua passagem pelo poder e pelo governo do PT.

Mas também avalia que será o ano em que perdeu quase tudo: a família, a empresa e a influência que imaginava exercer no governo Luiz Inácio Lula da Silva. "Mas em 2006, 2007, 2008, pode até ser que passe fome, porém já terão me esquecido. Eu virei um molambo e só tenho memórias", disse.