Título: Dono da Guaranhuns diz que tem medo de acabar como Celso Daniel
Autor: João Domingos e Mariana Caetano
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/08/2005, Nacional, p. A8

Em depoimento ontem à CPI do Mensalão, o dono da Corretora Guaranhuns, José Carlos Batista, disse que teme acabar como o prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT): "Não sou político, mas sinto-me réu político por ter sido usado pelo PT em coligação com o PL, motivo pelo qual estou com medo de acabar num cárcere infecto em regime de solitária, ou pior, acabar como o querido prefeito Celso Daniel, torturado cruelmente e, em seguida, assassinado."

Batista revelou que em novembro de 2002 assinou um contrato com o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza para intermediar a aquisição de até R$ 10 milhões em certificados de reflorestamento. Informou, ainda, que a compra desses títulos serviria para lavar dinheiro destinado ao pagamento das dívidas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A operação teria servido para encobrir gastos quitados com caixa 2. "Em razão do valor e do objeto da intermediação, indaguei sobre o que realmente se tratava e me foi assegurado que estaria intermediando a aquisição de certificados para poder fazer os pagamentos das dívidas da campanha do PT e sua coligação com o PL", registrou ele em texto entregue à CPI. Batista negou ter conhecido Valério: "Nunca o vi, nunca falei com ele."

No depoimento, o dono da Guaranhuns confirmou ter repassado dinheiro ao presidente do PL, Valdemar da Costa Neto - que renunciou ao mandato de deputado para fugir da cassação. Batista não quis dizer como os recursos eram entregues. O relator da CPI, deputado Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG), não resistiu e revelou sua suspeita: "A Guaranhuns era o próprio Valdemar Costa Neto."

Além do dinheiro que reconheceu ter repassado ao PL em 2003, o dono da Guaranhuns admitiu ainda ter movimentado R$ 9 milhões para partidos e candidatos entre fevereiro e novembro de 2002. Ele não revelou que políticos foram beneficiados, mas afirmou que essas operações não tiveram nada a ver com Valério.

FACHADA

O depoimento serviu para reforçar a suspeita de que a Guaranhuns era apenas uma empresa de fachada e Batista atuava como "laranja" de alguém. Apenas na primeira parte de seu depoimento o corretor repetiu por 28 vezes que não responderia às perguntas, porque não queria se auto-incriminar.

Com isso, fugiu das indagações mais simples, algumas em cima do texto que ele tinha lido minutos antes. Parecia muito nervoso. Gesticulava e errava nomes. Consultou seus advogados até para saber se poderia entregar à CPI cópia do que havia escrito para ser lido ali.

"Eu desisto", disse o relator Abi-Ackel, ao constatar que tudo o que perguntava recebia como resposta: "Eu me guardo o direito de não responder."

O texto que Batista leu no início do depoimento, no entanto, acabou por ajudar os parlamentares a tentar entender o caso que investigam, que envolve o pagamento pelo PT de dívidas dos partidos aliados, com a suspeita forte de que parlamentares receberam dinheiro para votar a favor de projetos de interesse do Palácio do Planalto.

Só para o caso do envolvimento da Guaranhuns com o esquema existem várias versões. Já não há mais dúvida, porém, de que ela foi usada, porque foi fechada em dezembro de 2003, quando Marcos Valério parou de mandar dinheiro.