Título: STF rejeita ação contra 'Veja' e defende liberdade de imprensa
Autor: Mariângela Gallucci
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/08/2005, Nacional, p. A16

Uma decisão do ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), reconheceu que a imprensa tem o dever de informar e fazer críticas, inclusive dirigidas a figuras públicas. No despacho que poderá servir de referência para outras situações semelhantes, o ministro determinou o arquivamento de um pedido de abertura de processo penal contra o presidente do Conselho Administrativo da revista Veja, Roberto Civita, e os jornalistas Marcelo Carneiro e Diogo Mainardi. O autor do pedido, o advogado Celso Marques de Araújo, alegava que era necessário instaurar o procedimento para apurar suposto crime de subversão contra a segurança nacional. O texto questionado pelo advogado, Quero derrubar Lula, foi publicado na edição de 3 de agosto da revista Veja.

Nas duas primeiras páginas de sua decisão, composta de sete laudas, Mello concluiu que os três jornalistas não têm foro privilegiado no STF, ou seja, não possuem o direito de ser investigados e processados perante o tribunal. Por esse motivo técnico, ele determinou o arquivamento do pedido. Mas o ministro dedicou o restante de seu despacho a considerações sobre a liberdade de imprensa.

Segundo Celso de Mello, os jornalistas exerceram concretamente a liberdade de expressão, prevista na Constituição, "que assegura, ao jornalista, o direito de expender crítica, ainda que desfavorável e exposta em tom contundente e sarcástico, contra quaisquer pessoas ou autoridades".

"Ninguém ignora que, no contexto de uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão penal ao pensamento, ainda mais quando a crítica - por mais dura que seja - revele-se inspirada pelo interesse público e decorra da prática legítima, como sucede na espécie, de uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional."

O ministro disse que a liberdade de imprensa compreende os direitos de informar, buscar a informação, opinar e criticar.

"A crítica jornalística traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer parcela de autoridade no âmbito do Estado, pois o interesse social, fundado na necessidade de preservação dos limites ético-jurídicos que devem pautar a prática da função pública, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar os detentores do poder."

Mello citou decisão na qual o Tribunal de Justiça de São Paulo concluiu que "os políticos estão sujeitos de forma especial às críticas públicas, e é fundamental que se garanta não só ao povo em geral larga margem de fiscalização e censura de suas atividades, mas sobretudo à imprensa, ante a relevante utilidade pública da mesma".

"O Estado não dispõe de poder algum sobre a palavra, as idéias e as convicções manifestadas pelos profissionais de comunicação", conclui o ministro Celso de Mello.