Título: Lula diz que sofre com crise e chama imprensa de 'ave de mau agouro'
Autor: Leonencio Nossa
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/08/2005, Nacional, p. A4

QUIXADÁ - Um dia depois de dizer que não vai se matar nem renunciar, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se queixou ontem da imprensa, dos adversários, e dos acadêmicos. "Quero que vocês saibam que, com toda essa crise que estamos vivendo, ando chateado, sofrendo muito quando vejo denúncias e mais denúncias, insinuações e mais insinuações e nenhuma prova até agora que possa condenar uma pessoa", afirmou, em discurso de improviso, na inauguração de um galpão de venda de produtos agrícolas, a 167 quilômetros de Fortaleza. "Estou com minha consciência tranqüila porque conheço a qualidade ética e o carinho do nosso povo", disse Lula, frisando que desempenhava o papel de "rádio peão", divulgando iniciativas da administração federal, já que a maioria do povo não lê jornal. O presidente criticou a cobertura jornalística dos escândalos e carimbou a imprensa com a expressão "ave de mau agouro".

"Acho importante lembrar números, porque os números vão ficar na cabeça de vocês, que serão mensageiros de boas notícias para aqueles que não vieram aqui ou serão mensageiros para aquelas aves de mau agouro que não querem enxergar um dedo na frente do nariz", expressou o presidente. "A imprensa não escreve mais, de tanto que já falei, mas vou continuar falando, porque vocês não lêem a maioria dos jornais."

O presidente reclamou também dos acadêmicos por julgar que não estão valorizando devidamente programas como Pronaf e Bolsa-Família: "Essas coisas, gente, não são percebidas, ainda, muitas vezes nas universidades brasileiras. São poucos os que enxergam isso." Disse ainda que os governos anteriores só trabalhavam para 35% ou 40% da população: "Em época de eleição, o povo pobre vale mais que o rico. Mas, depois, o pobre fica chupando dedo."

VERSO E PROSA

Diante de uma platéia de 3 mil pessoas, o presidente Lula citou um poema do guerrilheiro argentino Ernesto Che Guevara. "No tempo em que comecei a fazer o PT, dizia uma coisa que pensei ter esquecido: 'Os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas não podem deter a chegada da primavera'." E completou: "O presidente da República não tem que temer absolutamente nada, porque o povo saberá resolver os problemas do seu país."

Na visita à terra da escritora Raquel de Queiroz (1910-2003), autora do romance O Quinze, Lula disse conhecer a realidade sertaneja e confessou sofrer muito com os escândalos de corrupção. "Quero que vocês saibam que, com toda essa crise que estamos vivendo, ando chateado, sofrendo muito quando vejo denúncias e mais denúncias, insinuações e mais insinuações e nenhuma prova até agora que possa condenar uma pessoa", disse.

"Estou com minha consciência tranqüila, porque conheço a qualidade ética e o carinho do nosso povo." Antes de subir ao palco e discursar, Lula visitou estandes de pequenos produtores financiados pelo Banco do Brasil e um curral improvisado de bodes e cabras atrás do palco. O presidente se agachou para tirar leite de uma cabra apenas com a mão direita. Ainda no local tomou açaí e não quis responder a perguntas sobre as denúncias contra o governo.