Título: Grampo flagra esquema Leão Leão
Autor: Expedito Filho e Ricardo Brandt
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/08/2005, Nacional, p. A17

BRASÍLIA - As conversas telefônicas entre executivos da Leão Leão que o Ministério Público gravou com autorização judicial revelam como a empresa agia para vencer licitações. Marcelo Franzinne, um dos diretores que tiveram seus telefones grampeados e será ouvido hoje pela Polícia Civil, em Ribeirão Preto, era o braço operador do grupo. Cabia a ele o contato com os funcionários graduados dos municípios. Ele atuava em Ribeirão Preto, Araraquara, Barretos e até em São Paulo, onde dizia aos seus chefes na empresa que tinha uma amiga que o ajudava nos negócios com a Prefeitura. de São Paulo. A amiga é funcionária da Comissão de Licitações, na Secretaria de Serviços e Obras, na gestão da ex-prefeita Marta Suplicy (PT), segundo afirmou Rogério Tadeu Buratti, em seu depoimento à polícia.

Na maioria das conversas ela é tratada como "a charuteira". Franzinne assim relata uma dessas conversas ao então presidente do grupo Leão Leão, Wilney Barquete, a quem trata de chefe, durante conversa gravada em 27 de abril de 2004:

- A conversa lá com a moça, terminou ela subindo para falar com o chefe dela. Lá no órgão já tinha despachado os documentos, mas não tinha chegado aqui. Se chegar ainda hoje ela começa a disparar ainda hoje, porque já está pronta a publicação. A ata eu já vi. Se não chegar hoje, ela junta as duas atas e continua valendo a data de quinta. Mas para isso têm que chegar os documentos. Ela tá fazendo o papel dela com o chefe dela. Ela está azucrinando. Pela manhã, ela foi três vezes.

- Quem é o responsável para esses documentos andarem? -, pergunta Barquete.

- O cara que assina o despacho assinou ontem à noite e isso vai para uma central entre as secretarias e órgãos e cai na mão de um contínuo que vai fazer tramitar aí. Ela vai colocar um advogado dela e correr o processo e lá transmitir por fax antes de chegar.

- Tem boas perspectivas -, comemora o chefe.

- Dei uma conversada numa alternativa de a gente se encontrar de noite. Ela deu uma espanada. De manhã, ela mandou embora o advogado dela porque estava tratando esses assuntos em nome dela -, prossegue Franzinne.

O chefe ri e narra com ironia o estado de espírito da funcionária com quem estava tratando.

- Ela estava num humor hoje delicioso -, conta Franzinne.

- Tudo bem, vamos respeitar até porque tá avisado... -, adverte Barquete.

- Estou sentindo ela curiosa tanto quanto, tipo tá bom... Isso eu já entendi, mas vamos falar da receita -, continua Franzinne. Mas o chefe encerra a conversa imediatamente:

- Tá, tá -, diz Barquete.

Na época dessa conversa havia duas mulheres trabalhando na Comissão de Licitações da Prefeitura de São Paulo, segundo consta na ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Estadual no ano passado, por supostas irregularidades na contratação do lixo. Ambas serão investigadas e são Jealci Reimundes de Queiroz e Zenaide Fraga Bueno.

No dia anterior, noutra conversa, Barquete e Franzinne mencionam outra pessoa como ponte entre a empresa e a Prefeitura de São Paulo, a que tratam sempre como "Gordo" ou "Obeso". As suspeitas são de que seja Valdemir Garreta, ex-secretário de Comunicação e homem forte de Marta Suplicy.

No diálogo, Franzinne presta conta das investidas que fez em nome do grupo na Prefeitura. Referindo-se a alguém não identificado em relação às contratações do lixo e da varrição em São Paulo, ele relata:

- Ele faz um jogo meio larápio aí, e quis falar da semana passada para não ser acusado de não ter participado a gente dos acontecimentos. Aí eu falei, mandei o recado, falei que a gente tem de pressionar o máximo que puder porque o dele já está resolvido e a gente tem de resolver o nosso.

Na mesma conversa, Franzinne diz que um amigo recebeu um recado:

- O recado, que veio pela turma que manda, foi que a pessoa de cima ia falar lá e ia resolver.

Barquete fala de contato com Garreta para apoiá-los:

- O Bira (não identificado) não adianta né. Não tá chegando na ante-sala de onde precisa. Eu conversei com nosso ex-amigo e contei pra ele os prazos aí, e parece que ele teve contato e estou esperando a resposta. Ele teve algum contato com o "Obeso" e vamos ver... Espero que ele também dê uma sinalização.

Neste momento, Franzinne interrompe o chefe e diz que está vendo na TV notícia sobre a descoberta de rocha "nas obras do túnel" da Cidade Jardim:

- Ah, o Gordo tá aparecendo na televisão aqui.

Na época, Garreta deu esclarecimentos sobre a obra.

Em depoimento anteontem, Buratti disse que em relação a São Paulo sabia que havia acordo entre grandes empresas para vencerem a licitação da coleta de lixo e a Leão participaria da de varrição. Essa licitação está parada na Justiça. "A informação que o mercado divulgava é que não tinha pagamento mensal, mas nos processos eleitorais as empresas deveriam colaborar", disse Buratti.