Título: Serra diz que, 'neste momento', fica no cargo
Autor: Carlos Marchi
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/09/2005, Nacional, p. A14

O prefeito José Serra vestiu ontem um par de luvas de pelica: "Estou de acordo com o governador (Geraldo Alckmin). Ele tem expectativa de que eu permaneça (na prefeitura) e eu também. Neste momento eu voto com aqueles que dizem que eu não devo sair da prefeitura", afirmou. Na véspera, o governador engessou a possibilidade de uma candidatura Serra à presidência, lembrando que o atual prefeito firmara um compromisso público de cumprir o mandato até o fim. Por trás das boas maneiras, Serra encontrou uma forma discreta de dar o troco: depois de uma conversa com o governador Aécio Neves, de Minas Gerais, não o deixou responder, à saída, se será candidato à reeleição em Minas. "Eu não deixarei", disse Serra. "Acho que Aécio é um dos nomes para a presidência, tenho sempre citado isso, e acho que deve aberta essa possibilidade", disse, embolando o jogo no PSDB.

Perguntado se sentira a alfinetada da véspera, Serra minimizou o caso com uma frase de efeito: "Não senti alfinetada. A minha relação com ele (Alckmin) é tão estreita que não cabe um alfinete no meio", brincou. Antes, explicou que está voltado para o trabalho na prefeitura. "A gente não pode ir fazer um mutirão de saúde e ficar debatendo política nacional", salientou. Mas admitiu que fica contente com os resultados das pesquisas que lhe dão vitória sobre Lula nas simulações: "Claro que eu fico, que homem público não ficaria? Mas entre isso e ser candidato há uma distância enorme", objetou.

Mas assessores do prefeito confidenciaram que a fala de Alckmin foi recebida como uma desagradável surpresa, listada na esfera das frases "que não podem ser ditas por aliados". Serra ficou mais chateado porque não julga estar descumprindo as regras do jogo partidário, nem se lançando compulsivamente como candidato à presidência. "Ele não tem culpa de aparecer cada vez melhor nas pesquisas", disse um assessor.

ANO QUE VEM

Aécio não se fez de rogado ante o apoio de Serra à sua candidatura. Com elegância, devolveu a bola na mesma medida: "Aí quem diz sou eu. Certamente a candidatura do prefeito Serra é uma das melhores opções que o nosso partido tem". Lembrou os três outros potenciais candidatos tucanos - Alckmin, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o senador Tasso Jereissati -, mas registrou que, mesmo sendo radiografias de um momento, "os resultados das pesquisas são reais e estimulantes".

Serra e Aécio deixaram bem claro que o PSDB não tem mais dúvidas sobre a época apropriada para definir o seu candidato presidencial: será no começo de 2006, embora a convenção nacional para confirmar a escolha possa acontecer até junho. Justifica-se, portanto, o recrudescimento da disputa interna para ocupar espaços e se credenciar: hoje, os potenciais presidenciáveis tucanos têm pouco mais de quatro meses para, como dizem os políticos, "se viabilizarem como candidatos".

Aécio se desdobrou para passar a impressão de que essa disputa, dentro do PSDB, é natural e terá parâmetros civilizados e elegantes. Ele defende uma profusão de conversas entre os líderes e as instâncias partidárias, perpassando as áreas de influência dos governadores e da bancada tucana no Congresso. "Não há timing diferente entre nós", garantiu o governador mineiro.

Segundo ele, os nomes para a nova direção do partido e a candidatura à presidência da República serão escolhidos por consenso. "Essa capacidade de unidade que nós estamos demonstrando, inclusive com essas conversas, que fluem de forma muito tranqüila e natural, é que vai nos dar a condição de vencer e governar", observou.

Serra fez coro: aquele que for assumir a presidência do PSDB será resultado de um consenso, sem impasses ou disputas regionais. Segundo ele, não há conflito no partido por causa das indicações. Nomes? "Realmente, este não é o problema, nem foi o objeto da nossa conversa. Faremos uma boa Executiva para tocar o PSDB num ano decisivo para o futuro do partido e do País", disse.

Aécio admitiu o papel de algodão entre cristais e disse estar fazendo "o que Minas faz historicamente": conversar. "Nós temos uma oportunidade única, que não temos o direito de perder, que é apresentarmos ao País, no ano que vem, um projeto de desenvolvimento, uma proposta alternativa ao que está aí", assinalou.

O governador assinalou que o PSDB não pode se pautar pela atual agenda negativa do governo Lula: "Nós não temos de aguardar apenas a fragilização do presidente Lula e de seu governo. O PSDB amadureceu e estará em condições de, no ano que vem, de apresentar uma grande alternativa ao país".