Título: FHC sugere reforma eleitoral com aval popular
Autor: Wilson Tosta
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/09/2005, Nacional, p. A14

Mesmo tendo insistido anteriormente que não é candidato à Presidência em 2006, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) esboçou ontem uma rápida plataforma para o presidente que assume o cargo em 1.º de janeiro de 2007, começando por uma reforma eleitoral que, se não fosse aceita pelo Congresso, seria feita por referendo (consulta popular). Falando para médicos e executivos de medicina privada, o ex-presidente disse que a população precisa voltar a acreditar em seus representantes e defendeu prioridade para saneamento e segurança pública. "Nos (primeiros) cem dias (de governo), eu entraria também pela segurança", disse. Fernando Henrique disse que um candidato à Presidência deve apresentar uma proposta de reforma política, com temas como fidelidade partidária, aliança proporcional e outros. "Tem de se comprometer com o eleitorado e dizer: 'Olha aqui, vou mandar, na primeira quinzena de Congresso funcionando, um projeto com tais características, vou jogar meu peso nisso, e vou pedir referendo, se não for assim'", afirmou, respondendo a perguntas de participantes do seminário "Desafios e Perspectivas para a Saúde no Brasil", promovido pelo Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Casas de Saúde do Rio.

O ex-presidente justificou o recurso ao referendo por avaliar que haveria muita resistência no Legislativo a mudar as regras pelas quais é eleito. Sem se referir diretamente aos escândalos, atribuiu os problemas políticos do País ao sistema proporcional uninominal de votação, que multiplica o número de candidatos. "Quem votou não sabe em quem votou, e quem foi votado não precisa prestar atenção naquele que votou nele", disse. Para o tucano, o País deveria caminhar para o voto distrital uninominal (um deputado por distrito), começando pelos vereadores.

"Nada mais terrível para um sistema democrático do que a perda de crença nos representantes", destacou. "E nós estamos, obviamente, numa situação que se aproxima disso."

O ex-presidente não mencionou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas criticou-o indiretamente. "Não vamos descobrir a roda quadrada", disse. "Não existe isso. Vamos melhorar. A mania que se tem de que 'vamos mudar tudo...' Não vai mudar nada! Quem quer mudar tudo não muda nada! É preciso ver ir aperfeiçoando, ir melhorando, não ter a idéia de que você vai inaugurar a história. Não vai. Isso é tarefa de Deus. Não se meta a Deus. Fique na sua tarefa humana, que é avançar e fortalecer as instituições."

Fernando Henrique disse também que Espanha e Chile, pobres há algumas décadas, melhoraram aos poucos, pela persistência. "O Brasil fica aflito com razão, porque vê tanta desigualdade, tanta pobreza, e quer dar o salto. E sempre tem um demagogo que diz: 'Eu resolvo'. Não resolve. Não tivemos a maturidade de entender que tem solução, mas solução leva tempo e tem de ter um rumo. Não é dizer: 'Vou mudar tudo'. Não adianta confrontar a realidade com o sonho. O sonho ganha, mas a realidade não muda."