Título: Enquanto Waveland sumia...
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/09/2005, Internacional, p. A16

O furacão Katrina pareceu querer vingar-se de uma maneira especial nesta pequena cidade do Mississippi. O furacão virtualmente varreu Waveland do mapa, levando as autoridades locais a concluir que ela foi mais maltratada pelo vento e pela água do que qualquer outra cidade da costa. Na quarta-feira, as equipes empenhadas na tarefa de resgate encontraram ali sobreviventes exaustos. Eles retiravam o que podiam das casas e lojas completamente arrasadas pela ventania e inundação. O ar cheirava a gás natural, madeira e carne apodrecida.

"A devastação é total, não sobrou nada", disse Brian Mollere, um morador que apresentava cortes profundos e arranhões pelo corpo.

O Katrina arrancou as roupas dele e ele teve de revirar os destroços em busca de um calção e uma camiseta.

O Katrina arrastou quase todas as casas e lojas de madeira a um quilômetro longe da praia. As ruas ali hoje não levam a lugar nenhum. A água espalhou as sobras do que eram vidas tranqüilas, normais: fotos de família, bonecas Barbie, discos de jazz, garrafas de uísque.

A cidadezinha de 7 mil habitantes, a 55 quilômetros a leste de New Orleans ficou parcialmente isolada porque uma importante ponte rodoviária sobre a Baía de St. Louis foi destruída. Não há energia, nem telefones, nem como sair dali.

As autoridades estaduais não quiseram confirmar o número de mortos na cidade, mas o prefeito Tommy Longo calcula que pelo menos 50 moradores perderam a vida, conforme noticiou o jornal Clarion-Ledger. A sede da prefeitura desapareceu. Ficou de pé apenas um mural com uma cena praiana da altura de um joelho.

Mollere estava sobre os destroços da casa de dois andares e joalheria de sua família. Ele se lembrou de ter nadado para fora da loja com o cachorro quando a água subiu. E de ter procurado abrigo numa casa que resistiu ao furacão. "Se fosse noite, eu teria me afogado", disse.

A mãe dele, de 80 anos, morreu afogada na tempestade. Ela havia sido retirada com algumas famílias para uma confeitaria na vizinha Baía de St. Louis. Quando os membros da família saíram nadando para fugir do temporal, a mãe, que usava um cilindro de oxigênio, acabou ficando para trás.