Título: Assessor de Lula repassava dinheiro a Dirceu, diz irmão de Daniel na CPI
Autor: Rosa Costa e Lisandra Paraguassú
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/09/2005, Nacional, p. A15

Pela primeira vez, o irmão do prefeito de Santo André Celso Daniel (PT) - assassinado em janeiro de 2002 -, o médico João Francisco Daniel, revelou que duas outras pessoas testemunharam a conversa em que Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do presidente Lula, teria afirmado que entregava ao então presidente do partido, deputado José Dirceu (SP), dinheiro extorquido de empresas. Uma delas é seu irmão mais novo, Bruno Daniel. A outra testemunha ele não disse o nome, "por enquanto", por razões de segurança. Em depoimento à CPI dos Bingos, João Francisco declarou que a morte de seu irmão foi "crime planejado, premeditado". Ele afirmou que Gilberto Carvalho o procurou no dia 26 de janeiro de 2002 - seis dias depois do assassinato de Celso Daniel - e contou sobre a propina que ia para o PT. Na época, Carvalho ocupava o cargo de secretário de Governo do prefeito de Santo André. Os senadores da oposição já pressionam Lula para que exonere Gilberto Carvalho.

João Francisco lembrou que, ainda na Casa Civil, José Dirceu o processou por dano morais, mas no dia da audiência o ex-ministro pediu adiamento. Ele disse que Bruno estava presente, no dia 26 de janeiro, à primeira reunião com Carvalho. Segundo o médico, o assessor de Lula o procurou em casa no dia da missa de sétimo dia de Celso Daniel para "confidenciar" sobre esquema de propina na cidade. "Gilberto disse que morria de medo, quando recebia dinheiro em Santo André e tinha de ir até São Paulo, no seu Corsa preto, entregá-lo ao deputado José Dirceu."

Em uma ocasião, Carvalho teria afirmado que entregou R$ 1,2 milhão para Dirceu. Dinheiro de extorsão contra empresários seria usado no financiamento das campanhas do PT. "Gilberto dizia que o dinheiro era para a campanha da eleição de Marta Suplicy à Prefeitura de São Paulo e para outras do PT no Brasil", afirmou João Francisco. Apontou como membros do esquema, além de Dirceu e de seu próprio irmão, o ex-secretário de Obras, Klinger Luiz de Oliveira Souza, e os empresários Ronan Maria Pinto e Sérgio Gomes, o "Sombra". O médico disse que também foi informado por Míriam Belchior, ex-mulher de Celso, sobre denúncias de corrupção. Ela é assessora da Casa Civil.

João Francisco disse que ele e Bruno ficaram "estupefatos, de boca aberta". Segundo ele, Carvalho pediu que mantivessem a informação em segredo. "Ele estava preocupado e triste", lembrou. Carvalho voltou a falar no assunto, de acordo com o médico, 10 dias depois, quando se queixou de "Sombra". "O Gilberto disse que o Sérgio era muito violento, que constrangia os empresários (extorquidos) colocando um revólver em cima da mesa, quando ia conversar com eles", afirmou.

João Francisco disse que foi difícil expor seu irmão à execração pública ao revelar o que sabia ao Ministério Público. "Não tive saída, infelizmente ele (Celso) montou caixa 2 em Santo André para as campanhas do PT", alegou. Afirmou que assim poderia contrariar a tese do deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), de que Daniel foi vítima de crime comum. O parlamentar acompanhou as investigações em nome do PT.

"Quando Celso soube que o dinheiro ia para o grupo que estava enriquecendo de maneira estratosférica, quis tomar uma posição para brecar esse tipo de atitude", afirmou o médico, que colocou sob suspeita a iniciativa de Greenhalgh de endossar a tese de crime comum.