Título: Relação Brasil-China exige bom estudo e preparo de executivos
Autor: Marina Faleiros
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/09/2005, Economia & Negócios, p. B5

Guanxi. A palavra, que em mandarim quer dizer relacionamento, representa uma das coisas mais importantes para os chineses nos negócios, e pode ser a chave do sucesso para os brasileiros fecharem contratos e terem acesso a um dos maiores mercados do mundo. "Para os chineses, o relacionamento é a estrutura de um negócio, e é preciso haver confiança. Os chineses precisam sentir segurança, pois se abriram para o mundo ocidental há pouco tempo", diz a advogada Nancy I Pei Tsui, do escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados.

Nancy é filha de chineses e aprendeu mandarim em casa. Hoje, ela é uma das profissionais beneficiadas com o crescente interesse comercial dos brasileiros pela China. Em 2003, foi mandada por seu escritório para fazer um estágio naquele país.

"O escritório resolveu abrir uma área voltada só para a China, para atender empresas com interesses comerciais lá. Para isso, é importante falar corretamente e conhecer os detalhes das leis, o que demanda tempo e um convívio diário com a realidade chinesa."

No Mattos Filho, o sócio responsável pela relações com a China é João Ricardo de Azevedo Ribeiro. Ele conta que chegou a estudar mandarim durante um ano e meio, além de buscar mais conhecimento sobre a cultura do país. Uma das principais diferenças, destaca, é o tempo.

"Para concretizar um negócio é preciso ter um relacionamento muito maior do que estamos acostumados. Temos um ritmo mais acelerado, mas para atuar lá é preciso dedicar mais tempo, dinheiro e planejamento." Robert Wong, sócio da empresa de educação executiva Partnership & Learning, conta que muitas empresas chegam a levar dez anos para fechar negócios na China.

"Eles costumam, primeiro, fechar contratos pequenos. Pode não parecer promissor, mas esta é uma forma de criar empatia e passar confiança. Se o brasileiro não tiver flexibilidade para começar assim, pode perder grandes oportunidades", afirma.

Para Ribeiro, os brasileiros ainda não estão preparados para um bom relacionamento com os chineses, e a língua é um dos pontos mais críticos. "Não adianta simplesmente enviar os executivos para ter aulas de mandarim. É preciso contratar um intérprete, pois a comunicação é muito importante e não são todos que falam inglês", diz. Segundo Ribeiro, este é um dos responsáveis pelo fato de muitas empresas irem à China com grandes expectativas, mas voltarem sem fechar negócios.

O diretor-geral da empresa de importação Portes Trading, Fernando Galante, trabalha para chineses há 10 anos e conta que um dos maiores desafios sempre é explicar a cadeia de impostos brasileira. "É difícil explicar detalhes como PIS, Cofins, ICMS, entre outros, porque os chineses são muito rígidos e todas as contas têm de bater nos centavos", diz.

Galante já visitou a China para ver como os chineses trabalham no dia-a-dia, e disse que aprendeu a lidar com o modo mais reservado dos chineses. "Os brasileiros acabam falando demais e os chineses são mais fechados, demoram um pouco mais para adquirir confiança. Mas são bons negociadores e sabem ouvir muito, além de terem interesse pelo Brasil também."

Márcia Goraieb, diretora de comunicação e marketing da Ericsson Brasil, é outra que sente de perto este desejo dos chineses pelo Brasil. Ela conta que recebe, em média, oito comitivas de chineses por ano. "Dentro da Ericsson, o Brasil é um dos países mais visitados pelos chineses, pois temos um mercado muito similar e eles gostam muito de trocar experiências."

Segundo ela, os costumes dos visitantes variam muito conforme a região de onde vêm. "Na primeira visita que recebi, por ser mulher, nenhum deles olhou diretamente para mim, nem apertou minha mão. Trocaram cartões com todos os homens, mas me ignoraram", lembra.

Outros, pelo contrário, até já tomaram caipirinhas em churrascaria. Apesar de todo o cuidado para alcançar este gigantesco mercado, Robert Wong garante que não é preciso uma transformação completa para falar com um chinês. "Temos apenas que respeitá-los, e não negar nossas qualificações ou modo de ser."