Título: No ano passado, com Duda, um desfile ufanista e grandioso
Autor: Tânia Monteiro e Luciana Nunes Leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/09/2005, Nacional, p. A4

No ano passado, Lula desfilou sorridente no Rolls Royce presidencial, sem nenhum receio de receber vaias - não havia razão para temê-las. Os únicos protestos vieram das mulheres de militares, sempre a postos. Em 2003, o povo protestou porque queria estar mais perto de Lula e não conseguiu. Este ano, no mesmo Rolls Royce, o presidente parecia apreensivo; uma arquibancada exclusiva para convidados do Palácio do Planalto, com faixas vermelhas na cabeça garantia a sua incolumidade, bem em frente ao palanque oficial. De lá, só vieram aplausos. O público hostil foi mantido a uma distância prudente, à prova de som - as vaias eram um rumor distante e difuso.

Convocado para ser o mentor da festa de 2004, Duda Mendonça deu asas à imaginação e planejou um 7 de Setembro em tom triunfalista que fazia inveja aos desfiles do regime militar, emoldurado por grandes painéis e milhares de balões verde-e-amarelos, e a distribuição de bonés e bandeiras.

No ano passado, a festa feérica de Duda começava em tom triunfalista, com o maratonista e herói olímpico Vanderlei Cordeiro de Lima, medalha de bronze em Atenas apenas dois meses antes, conduzindo a Bandeira brasileira. Este ano, o quadro virou arremedo: na abertura, a Bandeira era conduzida por quatro atletas desconhecidos, que fizeram uma reverência ao presidente.

No ano passado, além dos militares, o desfile teve a presença alegre de estudantes, grupos de balé e até capoeiristas; este ano, um grupo de dança afro e outro de capoeiristas pareciam ter sido escalados menos para amplificar o espetáculo e mais para agradar ao convidado especial de Lula no palanque, o presidente nigeriano Olusegun Obasanjo.

Em 2004, o palanque era uma algaravia de convidados políticos e afetivos. Lula levou os quatro filhos, as noras, o neto, amigos de São Bernardo do Campo e de Marília e até a sogra do primeiro casamento de Marisa Letícia. Este ano, além da ausência de José Dirceu, parentes e amigos não foram vistos. Estavam lá os ministros de sempre e, comprometendo o prestígio do presidente no Congresso, não mais que três deputados, todos do PT.

Mas a diferença maior estava no público que costuma sair de casa nos feriados do Dia da Pátria para assistir ao desfile. As 50 mil pessoas que povoaram a Esplanada dos Ministérios em 2003, primeiro ano do governo Lula, e se repetiram em 2004, ontem se reduziam à metade. A outra metade ausente pode ter tido mil razões para não ir, mas entre os motivos suspeitos listava-se o desencanto com os rumos da Pátria.