Título: Os salários melhoram
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Fonte: O Estado de São Paulo, 05/09/2005, Notas e Informações, p. A3

O crescimento da economia, desde o ano passado, e o aumento da procura de mão-de-obra já se refletem na elevação de salários. Com maior poder de compra, os trabalhadores podem aumentar seu consumo e assim realimentar a expansão dos negócios, contribuindo para formar um círculo virtuoso. Um levantamento realizado em São Paulo com 28 sindicatos filiados à Central Única dos Trabalhadores (CUT) confirma essa tendência, já perceptível há alguns meses. Segundo a pesquisa, 86% das negociações completadas por essas categorias no primeiro semestre resultaram em ajustes salariais acima da inflação. Dos 14% restantes, metade conseguiu repor as perdas causadas pela alta de preços. No conjunto, foi um desempenho bem melhor que o do primeiro semestre do ano passado, quando 49% das categorias tiveram ganho real. O último relatório das contas nacionais, divulgado na quarta-feira pelo IBGE, mostra a evolução positiva do consumo. No segundo trimestre, as famílias consumiram 0,9% mais que nos três meses anteriores e 3% mais do que no trimestre correspondente de 2004. Em 12 meses, o crescimento acumulado chegou a 4,2%.

Essa evolução foi possibilitada pela combinação de dois fatores, o aumento real de 6,3% da massa de salários e o crescimento, em termos nominais, de 30,4% do saldo de operações de crédito com recursos livres para pessoas físicas.

No ano passado, os consumidores puderam ampliar seus gastos principalmente por causa da expansão do crédito pessoal. A indústria de bens de consumo com maior crescimento foi a produtora de bens duráveis, como automóveis e eletrodomésticos. As empresas produtoras de bens não-duráveis, como alimentos, bebidas e produtos de higiene e limpeza, tiveram desempenho relativamente modesto, no mercado interno, assim como as fabricantes de semiduráveis, como roupas e calçados.

Neste ano, o quadro tornouse mais animador. O aumento das contratações, visível já em 2004, contribuiu para a lenta recuperação do salário médio e para a expansão da massa de salários. A elevação do salário real foi facilitada também pelo êxito no combate à inflação. Quando os preços ficam mais perto da estabilidade, o poder de compra dos trabalhadores tende a aumentar.

Neste ano, portanto, o aumento do consumo dependeu muito menos do endividamento das famílias e muito mais do rendimento em alta. Isso foi muito positivo, especialmente porque a expansão do crédito consignado, isto é, descontado em folha, já se vinha tornando perigosa. Nesta altura, o melhor, para as famílias, é consumir com recursos próprios e usar o dinheiro mais barato do crédito consignado para liquidar dívidas mais custosas. O Estado de São Paulo, comentou o presidente da CUT paulista, Edílson de Paula, 'foi o carro-chefe da criação de postos de trabalho, gerando cerca de 55 mil por mês'. No País, acrescentou, foram criados de janeiro a junho cerca de 1 milhão de empregos.

Os dados da CUT são baseados na inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). No primeiro semestre a inflação acumulada em 12 meses variou entre 6,13% e 6,19%. Os melhores acertos salariais obtidos pelos sindicatos incluídos na pesquisa ficaram entre 8% e 10%. Na maioria das convenções, os ganhos reais ficaram entre 1% e 2%. Se nenhum acidente quebrar o ritmo de expansão da economia, os acordos salariais deste semestre serão pelo menos tão bons quanto os do primeiro, provavelmente melhores.

A indústria brasileira quase certamente estará preparada para atender, nos próximos anos, tanto ao crescimento da demanda interna quanto à expansão das exportações. Os investimentos do setor privado têm crescido e as últimas pesquisas de intenções, entre industriais, indicam a disposição de continuar investindo na ampliação da capacidade.

Para garantir um crescimento econômico equilibrado, com expansão do mercado interno e solidez na frente externa, falta o governo continuar melhorando suas contas e aumentar o investimento na infraestrutura econômica e social. Para isso não é preciso inventar: basta manter o rumo e aperfeiçoar a política já adotada.