Título: Indústria tem o pior resultado em dois anos
Autor: Jacqueline Farid
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/09/2005, Economia & Negócios, p. B5

Depois das surpresas positivas do primeiro semestre, a produção industrial chegou a julho pisando forte no freio. Houve queda de 2,5% ante junho, em resultado abaixo de todas as estimativas de analistas de mercado, no pior desempenho nessa base de comparação desde dezembro de 2002. Houve crescimento ante julho de 2004 (0,5%), mas o aumento foi o menor registrado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em dois anos.

O chefe da coordenação de Indústria do IBGE, Silvio Sales, disse que julho "pode ser um momento de ajuste forte e, a partir daí, a indústria pode retomar uma trajetória discreta de reação em agosto". "Se não, terá de se dar um peso maior à questão da consolidação das expectativas (pessimistas)", disse.

Segundo Sales, agosto será muito importante para avaliar a tendência da indústria, porque o mês, junto com outubro, apresenta o pico de preparação da indústria para o final do ano.

Para o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, olhar os números do IBGE referentes a julho é "lançar um olhar sobre o passado". De acordo com o ministro, os números referentes a agosto mostram recorde de produção e vendas de veículos.

"Não faz sentido olharmos para julho se agosto já mostrou concretamente a recuperação dos números", reiterou Furlan, que participou ontem do fórum "Oportunidades de Negócios e Investimentos na Nigéria", realizado na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

O diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Júlio Sérgio Gomes de Almeida, disse que os dados da indústria mostram que, após a estagnação, a economia brasileira voltou a crescer com muitas oscilações, porque está excessivamente dependente do crédito e das exportações.

Segundo ele, somente uma expansão baseada também no emprego e na renda será mais estável e consistente. "A economia reflete oscilações típicas de um crescimento que não está baseado em investimentos, emprego ou renda", disse, acrescentando não acreditar que a crise política tenha inibido a produção.

CONVERGÊNCIA

A queda da produção ante mês anterior, após quatro meses de expansão, na avaliação de Sales, pode significar que "está ocorrendo um importante ajuste de estoques concentrado em julho". Ele lembrou que as sondagens de expectativas de empresas e consumidores mostravam pessimismo e os dados de julho "tornam o desempenho real (da indústria) e as pesquisas qualitativas mais convergentes".

O economista do IBGE afirmou que "não é possível saber" se a crise política afetou o setor. Para Sales, o mais importante do resultado ante mês anterior é o espalhamento da queda, com as quatro categorias de uso pesquisadas com resultados negativos, e 20 dos 23 setores com recuo na produção.

Ele disse que os resultados de agosto da indústria serão fundamentais para uma avaliação mais clara do que ocorreu em julho.

TENDÊNCIA

Sales destacou que a estabilidade na produção diagnosticada no índice de média móvel trimestral - o principal indicador de tendência que, no trimestre encerrado em julho, foi 0,2% maior do que o terminado em junho - mostra que o crescimento recente da indústria foi tão forte que o significativo recuo de julho levou o setor a "estacionar", mas sem reverter ainda para uma tendência de queda. No ano, a produção acumulou alta de 4,3% em oito meses e, no indicador de 12 meses, registrou aumento de 5,8%.

No caso dos dados comparativos a julho de 2004, Sales avalia que o resultado foi influenciado pelo registro de um dia útil a menos em julho deste ano do que em igual mês do ano passado. Além disso, ele destacou que o denominador é crescente, com o aumento da base de comparação. O segundo semestre do ano passado registrou forte aquecimento na produção e essa base vai influenciar os dados mensais com mais força neste terceiro trimestre.

JUROS

O tom negativo dos dados da indústria em julho foi ressaltado pela queda na produção de bens de capital (-7,6% ante junho e -4,4% ante julho de 2004), que é um importante termômetro dos investimentos. O chefe da coordenação de Indústria do IBGE sublinhou ainda que os dados desse segmento são muito voláteis e a queda ocorreu após uma expansão acumulada de 9,6% em dois meses. Segundo ele, como as importações desses produtos estão crescendo, ainda não é possível afirmar que há queda nos investimentos, avaliação com a qual concorda o diretor do Iedi.

O lado positivo da pesquisa é que, no mercado financeiro, cresceram as apostas na queda da taxa básica de juros (Selic) em setembro, já que a avaliação é que os juros altos já não se sustentariam em cenário de desaceleração da atividade econômica. Ontem, os juros futuros estiveram em queda durante todo o dia.