Título: Infra-estrutura vai mal
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Fonte: O Estado de São Paulo, 14/09/2005, Notas e Informações, p. A3

Brasil perde feio de todos os principais concorrentes quando se trata de transporte, energia, água e saneamento. Infra-estrutura é essencial para quem pretende competir no mercado internacional. Nesse quesito é enorme a desvantagem brasileira. A malha viária é um bom exemplo. O País tem 26,4 quilômetros de vias de transporte por quilômetro quadrado de superfície. A China tem 38,3, o México, 57,2, e os Estados Unidos, 447, segundo estudo apresentado ontem pelo professor Paulo Fernando Fleury, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no 2º Fórum de Economia da FGV, em São Paulo. O investimento na infra-estrutura deixou de acompanhar há muito tempo as necessidades econômicas e sociais ¿ e os gargalos só não se tornaram mais dramáticos porque a economia há 20 anos vem crescendo pouco. Em 2004 foram gastos apenas R$ 8,6 bilhões dos R$ 10,8 bilhões previstos no Orçamento-Geral da União para investimentos, segundo o vice-presidente da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib), Ralph Lima Terra. Dinheiro público para investir tem sido escasso, mas esse não é todo o problema. O Tesouro é lento na liberação de recursos para os ministérios e nem esse dinheiro é totalmente aproveitado, porque falta capacidade gerencial para planejar e tocar obras. Para este ano estão previstos R$ 14,1 bilhões de investimentos no Orçamento da União e R$ 25,4 bilhões na programação das estatais. O total previsto para 2005 nas contas do governo inclui R$ 2,8 bilhões de um Projeto Piloto de Investimentos (PPI) combinado com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Nem essa parcela foi utilizada plenamente. Vários projetos nunca deslancharam e o governo decidiu substituir alguns para garantir o aproveitamento da verba.

¿A nossa expectativa é não ter sobra no PPI deste ano¿, disse ao Estado o secretário de Planejamento e Investimentos Estratégicos do Ministério do Planejamento, Ariel Pares.

Esse comentário pode ser surpreendente, mas apenas para quem acompanha de muito longe o desempenho da administração federal. Os PPIs são parte de uma experiência potencialmente importante para a política do FMI. Vários governos, e não só o brasileiro, cobraram do Fundo, durante anos, critérios mais favoráveis ao investimento público, para os programas de ajuste fiscal. Depois de muita discussão, combinou-se realizar um projeto experimental. Seriam selecionados projetos de rápido retorno financeiro para o Tesouro. Investimentos desse tipo, segundo argumentaram seus defensores, poderiam produzir benefícios para a economia em pouco tempo e contribuir, indiretamente, para o fortalecimento das finanças públicas.

Para o senso comum, o que menos se poderia esperar seria o atraso na execução de projetos desse tipo. O problema, portanto, não é apenas o pão-durismo do Ministério da Fazenda, empenhado em alcançar a meta do superávit primário. Combinados os dois fatores ¿ a demora na liberação de verbas e a ineficiência na gestão de projetos ¿, o governo federal só cumpriu 29,98% do orçamento federal para saneamento, obras rodoviárias e habitação social até agosto.

Desde o começo dos anos 90, a privatização de serviços públicos permitiu manter certo volume de investimentos em infra-estrutura. Houve grandes melhoras na telefonia. Ocorreu alguma recuperação da malha rodoviária, além de um começo de reativação das ferrovias. Mas a solução foi subexplorada.

Os investimentos com recursos privados têm sido dificultados, em alguns casos, pelo atraso na regulamentação. A demora na constituição do Fundo Garantidor das Parcerias Público-Privadas (PPPs) é um exemplo notório. Problemas de regulamentação têm atrasado, também, decisões de investimento em termoelétricas.

Além disso, ainda não se conseguiu conciliar as preocupações econômicas e ambientais. A análise de projetos é demorada e até para receber uma resposta negativa o investidor perde muito tempo. Também isso confirma que a escassez de dinheiro é apenas parte do problema. A ineficiência do governo também pesa ¿ e muito.