Título: Jefferson deve atacar Lula no dia da cassação
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Fonte: O Estado de São Paulo, 14/09/2005, Nacional, p. A6

Depois de quatro meses na ribalta, o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) deve sair hoje da cena política nacional. Mas não o fará sem antes apontar seu estoque de acusações em direção ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em Brasília, ontem, Jefferson sugeriu dispor de surpresas para a sessão de votação do pedido de cassação de seu mandato, que deve começar às 14 horas. Perguntado se acusaria o presidente de conhecer o esquema do mensalão - o suposto pagamento a deputados da base aliada - Jefferson foi irônico: "Vou falar 'beeeem' do presidente Lula e desse núcleo duro dele", disse, sorrindo. O deputado disse, também, estar pronto "para o que der e vier". "Eu tenho de passar por ele (o presidente). (O meu discurso) passa pelo governo dele (Lula)", afirmou.

Depois de ameaçar a sessão, em protesto contra a determinação do presidente Severino Cavalcanti (PP-PE) de presidi-la, a oposição garantiu presença em plenário. Assim, a cassação de Jefferson é apontada como certa.

Ontem, Jefferson sofreu uma derrota que se configura como uma avant-première da votação de hoje. A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ) rejeitou o recurso apresentado pelo deputado contra a decisão do Conselho de Ética que pediu sua cassação. No recurso, alegou que não teve direito de defesa. O relator do recurso, José Eduardo Cardozo (PT-SP), entendeu que lhe foi dado amplo direito de defesa. Jefferson deverá perder o mandato por quebra de decoro parlamentar.

Contra ele, segundo o relator de seu processo no Conselho de Ética, Jairo Carneiro (PFL-BA), pesam, entre outras, acusações de "abuso da inviolabilidade parlamentar", por fazer as acusações sobre a existência de um suposto esquema de pagamento de mensalão.

Carneiro acusou Roberto Jefferson, ainda, de ter-se omitido sobre o esquema do mensalão por mais de um ano, o que também representa, a seu ver, quebra de decoro parlamentar.

Se cassado, Jefferson promete virar cantor. Nesses quatro meses, o parlamentar carioca dominou a cena com entrevistas performáticas e três depoimentos no Congresso - no Conselho de Ética, na CPI dos Correios e na do Mensalão.

A crise do governo Lula guarda sincronia com as revelações homeopáticas de Jefferson, que atingiram em cheio o principal assessor palaciano, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. Na origem da crise está a denúncia de Jefferson segundo a qual uma mesada de R$ 30 mil foi paga a parlamentares do PL e do PP para que votassem a favor do governo em vários projetos. O baú de revelações de Jefferson foi aberto com a revelação da fita de vídeo mostrando o diretor dos Correios, Maurício Marinho, recebendo uma propina de R$ 3 mil supostamente em nome do PTB e do deputado.

Conhecido por integrar a "Tropa de Choque" do ex-presidente Fernando Collor de Mello, truculento e conservador, Jefferson surpreendeu as platéias com um discurso nada titubeante, agressivo - técnica obtida em longos anos como advogado em tribunal de júri.

Cada palavra, cada entrevista, cada gesto, tudo era calculado, produzindo resultados imediatos e baixas no governo e no próprio Congresso. Com a máxima "saí daí rapidinho", Jefferson provocou a saída de Dirceu.

As investigações desencadeadas pelas revelações de Jefferson trouxeram à tona a figura do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza, apontado como operador do mensalão, e mostraram a existência de saques em dinheiro por parte de parlamentares e assessores que deram credibilidade as denúncias do deputado.

Até ontem à noite dois parlamentares haviam renunciado a seus mandatos por causa das acusações, Carlos Rodrigues (PL-RJ) e o próprio Valdemar Costa Netto (PL-SP), autor do pedido de cassação de Jefferson. Resta saber se o discurso que fará em sua defesa no plenário terá o mesmo poder de fogo.