Título: Uma rotina cheia de obstáculos
Autor: Bárbara Souza
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/09/2005, Metrópole, p. C1

O mecânico Rogério Ferreira de Figueiredo se adaptou à cidade que não se adapta a ele. Aos 41 anos, paraplégico desde os 19, quando foi baleado em um assalto, ele raramente encontra calçadas sem buracos, na largura adequada e com guia rebaixada, como prevê a lei. Mesmo assim se aventura com sua cadeira de rodas entre a casa, em São Miguel Paulista, zona leste, e o trabalho, na Vila Mariana, zona sul, num percurso feito por ruas, ônibus e metrô. Rogério tem de ser pontual. Precisa chegar às 10 horas no Centro de Reabilitação do Hospital das Clínicas, onde conserta cadeiras de rodas e treina basquete, e não pode se dar ao luxo de perder o ônibus adaptado. O veículo - um dos 541 aparelhados para receber deficientes físicos em uma frota de 15 mil - passa no ponto às 8h20. Outro, só às 11 horas.

A ida de casa ao ponto de ônibus é feita na rua mesmo, entre carros e motos. 'É mais seguro.' No asfalto, ele muitas vezes tem de se espremer num canto. 'Muitos não respeitam. Sempre querem passar primeiro.' Rogério nem reclama mais. 'É perda de tempo.' Como também não se queixa do pequeno número de ônibus adaptados. 'No começo, quando nem tinha ônibus, ia até o Metrô Artur Alvim na cadeira.' Auxiliado pelo cobrador Vagner Luís Ferreira e pelo motorista Lucimário Amorim, Rogério sobe no veículo por um elevador na porta traseira e enfrenta um percurso de uns 30 minutos. Na chegada ao Terminal Itaquera, onde pega o metrô, Rogério tem de descer fora da área de desembarque. O ônibus, apesar de adaptado, não entra no terminal.

No metrô, os problemas ocorrem mais por falta de compreensão de passageiros. 'Muitas vezes preciso pedir licença para poder parar a cadeira no local de deficientes. Tem gente que ainda olha feio', diz. Mesmo assim, o metrô é uma das poucas coisas que mudam para melhor da periferia até a valorizada Vila Mariana.

Fora da estação, a calçada é rebaixada em uma só esquina - e não é a que Rogério usa para descer. Depois ele tem de, mais uma vez, se arriscar no meio das ruas.

A São Paulo Transporte (SPTrans) não respondeu à pergunta da reportagem sobre investimentos para aumentar a frota de ônibus adaptados. Quanto à falta de acesso dos veículos ao Metrô Itaquera, a SPTrans informou que, por falta de espaço, 22 das 29 linhas que entram no terminal são feitas por vans.

Outras 16 têm de usar a plataforma externa, incluindo a do ônibus adaptado.