Título: Brasil vai apoiar na ONU propostas de combate à miséria
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/09/2005, Nacional, p. A7

O comitê formado por Brasil, Chile, França, Espanha, Alemanha e Argélia vai apresentar na quarta-feira, em Nova York, uma declaração conjunta na qual recomenda uma série de propostas para financiar estratégias de combate à fome e à miséria. A lista inclui sugestão feita pelo presidente da França, Jacques Chirac, que prevê uma taxa na compra de bilhetes aéreos internacionais. A idéia é que a quantia arrecadada seja destinada aos países pobres. A taxa pode ser simbólica, na faixa de US$ 1 por bilhete, mas o valor ainda não foi estipulado. Exatamente um ano depois de reunir 60 chefes de Estado e de governo na ONU, num encontro batizado de Ação Contra a Fome e a Pobreza, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva endossará a proposta de Chirac. Num gesto mais político do que prático, o grupo encaminhará, ainda, um projeto de resolução prevendo que os países ricos reduzam os custos das remessas de dinheiro dos imigrantes e criem linhas de crédito específicas para estimular o desenvolvimento.

Na declaração produzida para a Cúpula do Milênio, Brasil, Chile, França, Espanha, Alemanha e Argélia também vão insistir em propostas bombardeadas pelos EUA, como a adoção de uma taxa mínima de 0,01% sobre transações financeiras internacionais e a tributação de armas pesadas, novas ou usadas, como formas de associar o desenvolvimento à paz.

A sugestão recebeu duras críticas da então ministra da Agricultura dos EUA, Ann Veneman, no ano passado. 'Impostos globais são inerentemente antidemocráticos e sua implementação é impossível', afirmou Veneman. Na época, Lula atribuiu as críticas à proximidade das eleições nos EUA, em novembro de 2004, já que George W. Bush era candidato à reeleição. 'Estamos num momento rico de eleição e, quem sabe, quando chegar em 2005, a gente vai perceber que as coisas que pareciam impossíveis serão totalmente possíveis', disse Lula na ocasião. Chirac fez coro com ele.

'Por mais fortes que sejam os EUA, não podemos imaginar uma resistência durável e vitoriosa a uma iniciativa aprovada por 110 países que estão criando um movimento político totalmente novo', comentou o presidente da França, lembrando o número de países que assinaram a Declaração de Nova York, no ano passado. Dez meses depois da reeleição de Bush, a resistência continua. 'Mas há chance política de concretizarmos essas propostas', garantiu o economista José Graziano, assessor especial de Lula. 'Os mecanismos sugeridos podem ser regulamentados pela ONU.'

CLAMOR

A nova declaração que será proposta pelo Brasil convoca os países desenvolvidos a destinarem 0,7% de seu Produto Interno Bruto (PIB) a nações de baixa renda, um compromisso reiterado no ano passado e solenemente ignorado. 'Tal esforço coletivo daria um impulso significativo e enorme credibilidade aos compromissos assumidos quando as Metas de Desenvolvimento do Milênio foram adotadas, há cinco anos', diz o texto.

Além disso, a declaração recomenda a adoção do International Financial Facility (IFF), mecanismo de financiamento sugerido pelo governo britânico e considerado bastante inovador. Pela proposta, o IFF emitiria títulos e os rendimentos obtidos seriam destinados ao financiamento de iniciativas de combate à fome. Os desembolsos ocorreriam até 2015 e os países beneficiados, indicados pelos doadores, teriam de adotar programas específicos de redução da pobreza.

Para o embaixador argentino César Mayoral, os resultados dos diferentes grupos de trabalho encarregados de estudar sugestões para o problema da fome e da miséria até agora são díspares e não obtiveram consenso. 'Esperamos que possamos diminuir as diferenças nos próximos dias', observou.