Título: Festa palestina: Gaza muda de dono
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Fonte: O Estado de São Paulo, 13/09/2005, Internacional, p. A12

Eufóricos e descontrolados, milhares de palestinos invadiram ontem as áreas deixadas pelo Exército israelense na Faixa de Gaza, incendiando sinagogas e comemorando o fim de 38 anos de ocupação. A multidão entrou nos terrenos onde se instalavam assentamentos judaicos antes mesmo de o último soldado israelense ter deixado o território, pouco depois do amanhecer. Os palestinos atearam fogo a várias sinagogas que tinham ficado de pé, cuja demolição a Autoridade Palestina (AP) havia marcado para ontem, num esforço de eliminar os símbolos da presença israelense em Gaza. Desprovidos de vestígios religiosos, os edifícios foram mantidos por decisão do governo israelense para não despertar a revolta de grupos judeus ultra-ortodoxos.

Centenas de palestinos também invadiram as praias às quais o acesso era exclusivo para moradores dos assentamentos judaicos. Cinco palestinos, incluindo duas crianças, morreram afogados nessas praias ontem.

Inicialmente, estava previsto que a população palestina não entraria nos assentamentos por 72 horas após a saída dos soldados, até que a AP avaliasse a situação e posicionasse suas forças de segurança.

Mas as autoridades não conseguiram conter a multidão, que em meio à festa saqueava o que podia das ruínas de 1.800 casas demolidas pelo Exército de Israel.

"Hoje é um dia de glória para nosso povo", declarou o presidente da AP, Mahmud Abbas. Ele lembrou que há um longo caminho pela frente até o estabelecimento de um Estado e descreveu a ocupação israelense de 38 anos como "agressão, injustiça, humilhação, morte e colonização".

Como símbolo da nova era, as forças palestinas que entravam nas áreas esvaziadas hasteavam a bandeira da AP, enquanto do sul de Gaza uma caravana de veículos com civis armados partia para as áreas onde antes se localizavam os assentamentos judaicos.

"A missão foi cumprida, uma era acabou", limitou-se a dizer o general Aviv Kohavi, último militar israelense a sair da Faixa de Gaza. Do lado israelense de Kisufim, Kohavi hasteou com seus soldados a mesma bandeira de Israel que, horas antes, tinha baixado da sede do comando-geral do Exército na Faixa de Gaza. "A partir de agora, a AP tem toda a responsabilidade pelo que ocorrer em Gaza", disse. O ministro da Defesa israelense, Shaul Mofaz, advertiu que a AP deve impor a lei e a ordem na Faixa de Gaza e impedir possíveis ataque contra Israel, "ou enfrentar uma dura reação" caso não o consiga.