Título: 'PT e PSDB querem parar cassações'
Autor: Ana Paula Scinocca
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/09/2005, Nacional, p. A7

Um dia depois de tornar-se o primeiro deputado cassado desde o início da crise do mensalão, Roberto Jefferson (PTB-RJ) disse que há um pacto entre PT e PSDB para poupar o mandato de outros deputados sob ameaça. "É evidente que existe um acordo entre PT e PSDB para evitar futuras cassações", reclamou. "O líder do PSDB (Alberto Goldman) fez campanha sistemática para me cassar. Quem esteve lá viu o que estou falando. Há um acordo surdo entre os dois partidos para interromper o processo." Indagado se o deputado José Dirceu (PT-SP) deve perder o mandato, Jefferson reagiu: "Não, acredito que sou o único a ser cassado."

Ele se mostrou aliviado com o fim do processo que culminou na perda de seu mandato. "Graças a Deus só durou cinco meses. De 14 de maio a 14 de setembro. E 14 é um número cabalístico. É o número do PTB e do dia em que nasci." Ao comentar a cassação, aprovada por 313 votos a favor e 156 contra, insistiu na idéia. "Sabia que meu desfecho seria aquele (a cassação). Só não sabia que o número seria aquele cabalístico, 313. Os 300 picaretas do Lula e o 13 do PT."

No seu melhor estilo, falou sobre as denúncias contra o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE). "Se comprassem toda a água que a primeira secretaria diz que compra, os parlamentares já teriam morrido afogados. Se usassem todo o papel higiênico que dizem, desculpem a palavra, seria a maior cagada do mundo", afirmou.

Na entrevista, Jefferson disse que Severino não tem condições de ser presidente da Câmara e deve renunciar o mais rápido possível. "Ele não tinha experiência e vivência", comentou.

Sobre a denúncia de que Severino cobrou propina do empresário Sebastião Buani, o ex-deputado disse "querer crer que um homem de 74 anos não pegou mensalinho". Depois, atacou o empresário. "Aliás, um homem como aquele Buani, Deus me perdoe. Não respeita a esposa. Não tem noção de valores."

Jefferson também convidou o ministro do Turismo, Walfrido Mares Guia, a deixar o PTB, caso continue no governo. "Faço um apelo à minha bancada para que se afaste do governo. Walfrido me disse que, a partir do momento em que eu fosse criticar o presidente Lula, ele se desligaria do PTB e ficaria no governo. É hora de fazê-lo."

O ex-deputado também disse não acreditar em um impeachment de Lula. Para ele, é melhor que o governo vá até o final, "sangrando". "Eu quero que ele vá até o final. Cada dia uma agonia. Se você interromper agora, ele pode dar uma de Chavez (Hugo). Deixa ele lá. Ele está cumprindo um papel."

Jefferson disse que já começou a recolher os R$ 4 milhões que afirma ter recebido do PT. O dinheiro, segundo ele, foi "integralmente" distribuído para prefeitos e petebistas que concorreram nas eleições de 2004.

O primeiro dia como ex-deputado, Jefferson passou em casa. Saiu apenas no fim da tarde para cumprir a promessa que fizera no dia anterior: falar aos jornalistas. Durante todo o dia, recebeu telefonemas e a visita de amigos.

Tentou mostrar tranqüilidade, mas admitiu que "a ficha" ainda não caiu. Jefferson avisou que não pretende disputar mais nenhuma eleição. Mas vai lutar para reaver os direitos políticos. "Voltar para o Parlamento, nunca mais." Disse que até o fim do mês desocupará o apartamento funcional. Pretende pedir a aposentadoria, após 23 anos de mandato, voltar a advogar e gravar um CD com músicas napolitanas.

Não mostrou arrependimento. E, citando a música My Way, comentou: "Fiz tudo ao meu modo. Não ajoelhei. Continuo de pé."