Título: Ambiente insalubre
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/09/2005, Notas e Informações, p. A3

Dadas as conhecidas dificuldades que o empreendedor brasileiro precisa enfrentar para abrir, operar e fechar uma empresa, não surpreende a má classificação obtida pelo País no estudo do Banco Mundial (Bird) sobre o ambiente para a realização de negócios. Numa lista de 155 países, o Brasil ocupa apenas a 119ª posição, atrás de alguns dos principais competidores na disputa por mercados e investimentos internacionais, como México (73 colocado), Rússia (79), China (91) e Índia (116). Mais preocupante do que a colocação ruim é a piora em relação à pesquisa anterior, realizada em 2004, quando o Brasil ocupou a 96ª colocação. Parte da queda é explicada pela inclusão de 20 países na lista do Bird. A introdução de novos indicadores, entre os quais comércio internacional e carga tributária, também explica a queda. O que o relatório deixa claro é que o Brasil, apesar das mudanças para melhor observadas nos últimos anos, continua sendo um país muito ruim para a realização de negócios. Estabilidade econômica e abertura do mercado, entre outros fatores macroeconômicos, são essenciais para assegurar o crescimento sustentado, mas o aumento constante dos investimentos produtivos, a geração do emprego e a evolução da produtividade média dependem de muito mais do que isso. Dependem de um setor privado ativo, o qual, por sua vez, depende de regras claras, que sejam obedecidas.

Reformas destinadas a criar ambiente mais favorável à atividade empresarial vêm sendo colocadas em prática em todo o mundo. É surpreendente que a lista dos países que mais promoveram reformas nesse sentido em 2004 seja liderada pela Alemanha, a terceira maior economia do mundo. Mas outros países, inclusive os em desenvolvimento, também promoveram mudanças para facilitar a atividade empresarial.

O que esses países mostram é que a facilitação dos negócios não significa necessariamente, como criticam algumas pessoas ainda dominadas por preconceitos ideológicos, regulamentar menos ou reduzir impostos. Países como os nórdicos, que ocupam o topo da lista dos 30 melhores, como Noruega, Dinamarca, Islândia, Finlândia e Suécia, regulamentam a atividade econômica tanto quanto os demais, ou até mais. Mas o fato é que, neles, a regulamentação é simples e concentrada onde é necessária, como na proteção dos direitos de propriedade e na provisão de serviços sociais. Também nesses países a carga tributária é elevada. Mas, ao contrário de outros países que tributam muito, como o Brasil, os contribuintes, e a sociedade em geral, têm a contrapartida necessária, que é a prestação de serviços na quantidade e na qualidade proporcionais ao peso dos impostos. Por isso, neles a informalidade é baixa.

A classificação do Bird é baseada em critérios como dificuldades para abrir uma empresa, a burocracia para a obtenção de licenças, regras de contratação e demissão de empregados, procedimentos para registro e proteção da propriedade, regras para obtenção de crédito, proteção dos investimentos, regras de comércio exterior, eficiência do sistema judiciário, carga tributária e procedimentos para encerramento de uma empresa.

Na maior parte desses critérios, a classificação brasileira é ruim. Todo o País perde com isso. Quanto mais difícil a abertura de uma empresa e mais cara sua operação, maiores são os incentivos para a informalidade. E, quanto maior a informalidade, mais receita o governo perderá e menos eficiente será a economia.

Se outros fatores fossem considerados, como a disponibilidade de infra-estrutura e segurança, talvez o Brasil ficasse ainda mais para trás. Mas a nova Lei de Falências, que entrou em vigor depois da conclusão da pesquisa do Bird, deve melhorar bastante a classificação na próxima edição desse trabalho.

Melhoraria ainda mais se o Brasil acelerasse outras reformas. O Ministério da Fazenda chegou a dizer que este seria o ano dessas reformas, chamadas de microeconômicas. A crise política tornou inviável sua discussão. Fala-se na criação de uma agenda positiva, para preservar e impulsionar a economia. Tais reformas poderiam servir de base para essa agenda.