Título: Cheque da propina deixa Severino à beira da cassação
Autor: Luciana Nunes Leal e Vannildo Mendes
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/09/2005, Nacional, p. A4

O empresário Sebastião Augusto Buani levou ontem à Polícia Federal a prova que havia prometido contra o deputado Severino Cavalcanti (PP-PE). A cópia de um cheque do dia 30 de julho de 2002, assinado por Buani e sacado pela secretária do deputado, Gabriela Kênia dos Santos da Silva Martins, no valor de R$ 7.500, foi entregue ao delegado Sérgio Menezes. O documento tornou praticamente insustentável a permanência de Severino Cavalcanti na presidência da Câmara.

Segundo o empresário, o cheque foi parte do pagamento de propina cobrada pelo deputado para prorrogar a concessão de quatro restaurantes e sete lanchonetes que mantinha na Câmara. O delegado recomendará ao Supremo Tribunal Federal, que presidirá o inquérito a partir de agora, o indiciamento de Severino por corrupção passiva, concussão (extorsão praticada por funcionário público) e improbidade administrativa.

Buani havia mencionado inicialmente um cheque de julho de 2003 sacado pelo motorista Paulo Sabino e disse que teve 'uma surpresa muito grande' ao receber do banco Bradesco cópia do um outro cheque: era nominal a Gabriela, endossado por ela no verso, e datado de julho de 2002. O empresário confirmou nova revelação feita na véspera de que, ao longo de 2002, fez vários pagamentos a Severino, os mensalinhos. Naquele ano, Severino era primeiro-secretário da Câmara.

A primeira versão de Buani era de que, em 2002, tinha pago uma parcela de R$ 40 mil, no dia 4 de abril, data da assinatura de um documento sem validade legal que prorrogava a concessão até janeiro de 2005. Inicialmente, Buani falava no pagamento de oito mensalinhos de R$ 10 mil, todos em 2003, entre fevereiro e setembro. 'A história do mensalinho é anterior ao que eu imaginava ser.

Começou em 2002. O que eu sofri de pressões para pagar esse dinheiro mensal não correspondia a apenas cinco ou seis meses (de 2003). Quando cedi, em abril de 2002, abri a porteira. Meu calvário não durou apenas cinco ou seis meses, durou mais de um ano', disse Buani, em entrevista coletiva na sede da Polícia Federal. Segundo o empresário, Severino cobrava a propina por telefone e, às vezes, pessoalmente, quando ia almoçar no restaurante Fiorella, no 10º andar da Câmara.

´UM ARROCHINHO´

Segundo Buani, o cheque foi entregue por ele diretamente a Severino, no Fiorella. 'Ele ia lá quase diariamente almoçar. Durante as refeições, dava um aperto, dava um arrochinho.

Ele dizia: ´Hoje é dia que eu tenho uns compromissos pela frente, não vai me deixar na mão.´ Em julho eu não tinha dinheiro, porque tinha recesso (férias no Congresso). No fim do mês, ele disse: ´Assumi meus compromissos, não posso ficar por conta disso´. Eu disse que não tinha de onde tirar. Sabe o que ele respondeu? ´Tira da sua conta na Suíça´. Fiz o cheque.

Todos os outros pagamentos foram em dinheiro'.

No início da entrevista, o advogado do empresário, Sebastião Coelho da Silva, disse que seu cliente recebeu 'ofertas' para não levar as denúncias adiante. O empresário preferiu negar: 'Não recebi nenhum tipo de pressão ontem e hoje. A pressão foi logo que estourou o assunto'.

Buani também não confirmou se foi procurado por Severino ou por algum emissário, para negociar.

Sebastião Coelho falou da suposta tentativa de frear as denúncias como introdução para um pedido de que empresários façam doações com depósitos na conta corrente de Buani: ele deve mais de R$ 100 mil à Câmara, por nove meses de aluguel do restaurante Fiorella.

Ao ser informado de que uma possível versão de Gabriela poderia ser a de que recebeu um empréstimo dele, Buani, o empresário antecipou uma resposta. 'Se eu tivesse dinheiro para emprestar a juros, não estaria na situação em que estou.

Não emprestei, principalmente a esta pessoa (Gabriela). Que intimidade eu teria? Nunca emprestei um tostão a juros. O cheque foi sacado da minha conta pessoal, de capital de giro', afirmou. O empresário evitou falar em punições para Severino. 'Quero que a Justiça de Deus seja feita', disse.

A expectativa dos advogados é que Buani não seja indiciado por corrupção ativa, o que será decidido pelo Supremo Tribunal Federal.