Título: Por 313 votos a 156, Câmara cassa o mandato de Roberto Jefferson
Autor: João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/09/2005, Nacional, p. A8

A Câmara cassou na noite de ontem o mandato do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) por 313 votos a favor e 156 contrários, mais 13 abstenções, 5 votos em branco e 2 nulos. Foi a primeira de uma série de 18 cassações previstas, entre elas a do presidente da Casa, Severino Cavalcanti (PP-PE), do ex-ministro José Dirceu (PT-SP) e de ex-líderes como Paulo Rocha (PT-PA), José Borba (PMDBPR), Professor Luizinho (PTSP) e João Paulo Cunha (PTSP). Para a cassação, seriam necessários 257 votos. Portanto, foram dados 56 votos a mais do que o necessário. Outros dois acusados renunciaram a seus mandatos para preservar os direitos políticos: Valdemar Costa Neto (SP), presidente do PL, e Carlos Rodrigues (sem-partido-RJ).

A sessão foi presidida pelo primeiro vice-presidente José Thomaz Nonô (PFL-AL), porque o titular Severino Cavalcanti não foi à Câmara. Estava envolvido em seus próprios problemas. Nonô deu início à ordem do dia com uma advertência: 'Hoje não é uma sessão rotineira, nem prazerosa; é uma sessão importante, difícil.

Acho que contribuiríamos muito para a imagem da Casa prestando a maior atenção possível ao que vai ser dito pelo relator, pelos advogados e pelo próprio acusado. Portanto, quero fazer um apelo aos meus pares para que nesta sessão fujamos, na medida do possível, das conversas paralelas e prestemos atenção ao que será discutido pela Casa.' Pelo menos durante o discurso de Jefferson ele foi atendido. O plenário ouviu o futuro cassado em silêncio absoluto.

Jefferson ficará com seus direitos políticos suspensos por oito anos a partir da data em que terminaria seu mandato, ou seja, fevereiro de 2007. Significa que ele só poderá disputar eleição depois de fevereiro de 2015. Como em ano ímpar não há eleição no Brasil, ele só poderá se candidatar em 2016.

Jefferson não quis permanecer em plenário para ver o resultado. Curiosamente, ele e José Dirceu, a quem acusara de ser um dos responsáveis pelo esquema de corrupção no governo e no Congresso e de ter, entre outras irregularidades, transformado o Parlamento no prostíbulo do Palácio do Planalto, cruzaram-se na fila de votação. E não se falaram.

Outra curiosidade na sessão envolveu de novo o deputado José Dirceu, que daqui a alguns dias deverá enfrentar a mesma situação que Jefferson, pois também responde a processo de perda de mandato. Ao depositar o voto na urna, Dirceu esqueceu-se de colocá-lo no envelope. Como este foi o único voto não envelopado, o presidente Thomaz Nonô declarou-o nulo, pois poderia ser identificado.

A ordem do dia da sessão que cassou o mandato de Roberto Jefferson teve início às 16h03, logo depois de uma pequena interrupção de menos de dois minutos, enquanto era aguardada a chegada do relator do processo no Conselho de Ética, deputado Jairo Carneiro (PFL-BA). A votação terminou às 20h30 e a apuração às 21h23.

Carneiro, que seria chamado de 'fascista' por Roberto Jefferson, pediu a cassação do expresidente do PTB sob alegação de que ele não denunciara o esquema do mensalão, mesmo sabendo de sua existência.

PEREGRINAÇÃO

Jefferson, é claro, o contestou. 'Fiz peregrinação. Falei sobre isso pelo menos 10 vezes com José Dirceu, por duas vezes com o presidente Lula e também com os ministros Ciro Gomes e Miro Teixeira'. Para Jairo Carneiro, Jefferson confessou crime ao dizer que recebeu recursos no valor total de R$ 4 milhões irregularmente do PT para as campanhas do seu partido.

'Ele admitiu que deveriam provir exatamente das mesmas fontes empregadas para alimentar o suposto mensalão, empresas privadas que mantêm contratos com o governo, não vendo no fato, entretanto, senão uma prática eleitoral corriqueira não reprovável, o que revelava um juízo divorciado dos padrões comuns de ética e de moralidade que se poderiam esperar de um homem de vida pública', disse Jairo Carneiro.

A defesa de Jefferson foi feita pelos advogados Itapuã Prestes de Messias e Luiz Francisco Correa Barbosa. Este último reafirmou a tese do mensalão - que Jairo Carneiro disse não ter sido totalmente comprovada. 'Será que só o egrégio Conselho de Ética desta Casa não ficou sabendo da existência do mensalão? Mas a Casa sabe.

Ah, Ulysses Guimarães! Ah, livro verde aqui promulgado! Ah, direito de defesa! Ah, o cotraditório! Ah, o devido processo legal! Sobretudo, falando para parlamentares: Ah, imunidade e inviolabilidade na proferição de quaisquer opiniões, palavras e votos! Hoje foi Roberto Jefferson; amanhã poderá ser qualquer um daqui.' As palavras do advogado da defesa, no entanto, não intimidaram os presentes.

O deputado Nilton Capixaba (PTB-RO), que trabalhava para evitar a cassação, se disse surpreso com a diferença na votação. 'Nós acreditávamos que Jefferson seria absolvido', disse ele.

Capixaba foi pessoalmente a Jefferson comunicar o resultado. Mas, no meio da votação, o advogado Luiz Francisco telefonou para Jefferson e perguntou se ele havia guardado o vinho para a comemoração