Título: Maluf tirou dólares de Jersey pela conta Chanani, acusa MP
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/09/2005, Nacional, p. A18

O Ministério Público Federal concluiu que a conta Chanani, que levou Paulo Maluf para a cadeia, serviu de passagem para recursos que o ex-prefeito teria movimentado na Ilha de Jersey, paraíso fiscal do Canal da Mancha. Relatório pericial em poder do MPF indica que "parte considerável dessa movimentação teve como origem o banco Deutsche Morgan Grenfell, sediado em Jersey, e o banco UBS (Suíça), de Londres, por meio de contas correntes tituladas pelas empresas Kildare e Durant". O documento revela que a Durant International Corp. é uma offshore "ligada a Paulo Maluf". Extratos do Safra National Bank de Nova York, enviados pela Promotoria Distrital de Manhattan ao governo brasileiro, apontam transferências da Durant para a conta Chanani, em 1998, no montante de US$ 27 milhões - os peritos apuraram que desse total US$ 7 milhões foram provenientes do Citibank de Jersey, "cujo pagador final foi o Citibank de Nova York". Outros US$ 16 milhões saíram do UBS de Londres, US$ 1 milhão do Swiss Bank - o relatório não especifica de qual país - e US$ 3 milhões "oriundos do Citibank (também sem país de origem)".

Jersey é um alvo quase inexpugnável da investigação de procuradores da República e promotores de Justiça que miram Maluf há cinco anos. Inúmeras vezes, o Ministério Público e a Justiça brasileira pediram cooperação das autoridades da ilha. "Há anos, o Estado brasileiro tenta, ainda sem sucesso, por intermédio de cooperação penal, o acesso a dados bancários de contas supostamente vinculadas a Maluf", assinalaram os procuradores Pedro Barbosa Pereira Neto e Rogério de Grandis, autores do pedido de prisão do ex-prefeito, acolhido pela juíza Silvia Maria Rocha, da 2ª Vara Criminal da Justiça Federal.

LIBRAS

Há pouco mais de dois meses, o governo José Serra (PSDB), prefeito de São Paulo, fechou a contratação do Lawrence & Graham, tradicional escritório londrino, para solicitar formalmente a Jersey o bloqueio de ativos em nome de Maluf e a repatriação e incorporação desses valores ao Tesouro municipal. O escritório inglês está a serviço do governo brasileiro - a Prefeitura e a Advocacia-Geral da União (AGU) celebraram convênio que prevê a contratação de advogados especialistas em recuperação de bens subtraídos dos cofres públicos. "O dinheiro desviado precisa voltar", declarou o secretário municipal de Negócios Jurídicos, Luiz Antonio Marrey.

O negócio está custando 320 libras por hora trabalhada para o contribuinte paulistano, 70 mil libras por etapa vencida no embate jurídico de Jersey - Maluf também contratou advogados na ilha para contestar a liberação de dados. Cada etapa do processo corresponde a um avanço rumo à recuperação total de ativos que Maluf teria internado na ilha, depois de fechar contas na Suíça.

A Chanani foi operada pelo doleiro Vivaldo Alves, o Birigüi, acusador de Maluf. Ele declarou à Polícia Federal que abriu a conta no Safra National Bank para captação de valores enviados pelo ex-prefeito e pelo filho mais velho dele, Flávio. Diretor-presidente da Eucatex, Flávio também está preso na PF. A investigação federal atribui aos Maluf corrupção passiva, crime contra o sistema financeiro (evasão de divisas), lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. O ex-prefeito teria se beneficiado de um esquema de propinas e superfaturamento de obras públicas, como a Avenida Água Espraiada e o Túnel Airton Senna.

Birigüi foi arregimentado pelo ex-diretor financeiro da Mendes Júnior, Simeão Damasceno de Oliveira. À Promotoria de Justiça da Cidadania, Simeão entregou dados relativos a transferências -US$ 11,15 milhões - destinadas a Maluf, em 1998, para a Chanani, que movimentou US$ 161 milhões. "Paulo Maluf e Flávio eram os principais beneficiários da movimentação financeira da Chanani e de suas sucessoras, Ugly River e Madison Hill Ventures", destacam os procuradores.

Na denúncia formal contra os Maluf, o MPF sustenta que a Chanani foi aberta a pedido de Flávio, no segundo semestre de 1997, por intermédio do funcionário do Banco Safra Laércio Brandão Teixeira Filho, que teria providenciado a documentação necessária, "toda ela americana, mas assinada no Brasil por Vivaldo Alves". Segundo os procuradores, até 2001 Birigüi "operou contas em território americano por ordem de Flávio e no interesse de Paulo Maluf".

Documentos internacionais encaminhados ao Brasil pelo Tribunal de Genebra revelam que Maluf, de próprio punho, determinou a seus advogados a constituição da Durant International Corp. junto ao UBS, de Londres, em 1996. "Tal empresa não só foi efetivamente constituída como exerceu intensa atuação na transferência de recursos ilícitos por parte de Maluf", anotam os procuradores.