Título: Juíza decreta prisão e Maluf se entrega à PF em São Paulo
Autor: Fausto Macedo e Marcos Rogério Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/09/2005, Nacional, p. A17

Paulo Maluf, aos 74 anos, passou a sexta-feira respirando o ar puro da montanha, ao lado de Sylvia, sua mulher - mas à noite deixou a confortável residência de Campos do Jordão e desceu a serra disposto a se apresentar à Polícia Federal. Era um homem tenso, aflito, preocupado, a caminho da prisão. Não sabia, ainda, o teor da decisão de Silvia Maria Rocha, juíza titular da 2.ª Vara Criminal Federal, mas já desconfiava que suas horas de liberdade haviam chegado ao fim. Não estava equivocado: a juíza decretou sua prisão preventiva e também a de seu filho mais velho, o empresário Flávio Maluf. No início da madrugada, demonstrando abatimento, cabisbaixo, ele chegou à PF, acompanhado de advogados. Em silêncio, foi para o cárcere.

Silvia, a juíza, está convencida de que o ex-prefeito e o filho estão envolvidos em crime financeiro (evasão de divisas), quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A prisão dos Maluf foi ordenada para 'conveniência da instrução criminal'. Eles estariam agindo intensamente para ocultar provas ou intimidar testemunhas que podem incriminá-los na investigação sobre US$ 161 milhões que teriam enviado ilegalmente para os Estados Unidos.

A juíza acolheu integralmente denúncia apresentada pela Procuradoria da República e abriu processo contra os Maluf e também contra o doleiro Vivaldo Alves, o Birigüi, e o ex-tesoureiro da empreiteira Mendes Júnior, Simeão Damasceno de Oliveira.

'Não sei de nada', declarou Maluf, às 23h14, ao ser procurado pelo Estado para falar sobre a decisão judicial. 'Não sei de nada, estou aqui em Campos do Jordão descansando com a minha família', esquivou-se. Àquela altura, já estava orientado por seus advogados que o melhor caminho seria o da apresentação espontânea à polícia.

À tarde, o ex-prefeito procurava contornar a agonia. 'Estou tranqüilo, estou tranqüilo porque não existe nenhuma razão jurídica, nem razão legal, para que se cometa esse ato impróprio. Não há nenhuma razão para isso, para que decretem minha prisão ou a do meu filho. Nunca deixamos de comparecer a qualquer convocação da Justiça.'

'Vão se apresentar', declarou o criminalista José Roberto Batochio, que integra a tropade-choque de defesa da família Maluf. Ele conversou com Flávio e recomendou ao diretorpresidente da Eucatex que se entregue, o que deverá acontecer ainda neste sábado. 'Não haverá espetáculo e degradação pública', disse Batochio.

Ninguém vai fugir. Todas as decisões da Justiça serão acatadas imediatamente.' A prisão dos Maluf foi requerida pelo procurador da República Pedro Barbosa Pereira Neto. Ele vê razões de sobra para que o ex-prefeito e seu filho passem longa temporada atrás das grades.

'Eles (Maluf e o filho) montaram uma estrutura de poder para controlar as investigações, queriam manter o total controle, queriam decidir sobre o que as testemunhas deveriam falar ou não', sustenta o procurador.

'As provas são muito fortes, nunca tivemos provas tão fortes.' Barbosa Neto reuniu provas de que o ex-prefeito movimentou fortuna no exterior.

Documentos que a Promotoria Distrital de Manhattan enviou ao Brasil mostram o fluxo da conta Chanani, operada pelo doleiro Birigüi no Safra National Bank de Nova York - US$ 161 milhões que teriam sido desviados do Tesouro por meio de contratos superfaturados.

Birigüi é testemunha-chave, contra Maluf e Flávio, na avaliação do MPF e da Polícia Federal.

Ele depôs 3 vezes à PF, entre julho e agosto. Esmiuçou a Chanani e delatou o ex-prefeito, que o acusa de extorsão. O doleiro teria exigido US$ 5 milhões para não contar o que sabe. Birigüi nega a extorsão. Flávio disse que não conhece o doleiro.

'Flávio é ingênuo', reagiu o acusador, que entregou ao promotor de Justiça Silvio Marques cópia do certificado de garantia de um relógio suíço Hublot - presente de US$ 7 mil que Flávio teria dado a Birigüi no Natal de 1998, ano de abertura da conta Chanani.

Escuta telefônica realizada pela PF, com autorização judicial, revela intensos contatos de Flávio com Birigüi - o empresário tentando convencer o doleiro a não depor. 'Está muito clara a estratégia de obstrução que eles (Maluf e Flávio) adotaram', destaca o procurador.

'Queriam uma certa diretriz, obstruir a investigação.' Para o delegado Protógenes Queiroz, que conduziu o inquérito federal, 'a liberdade (dos Maluf) oferece risco à investigação, indícios de ameaças e ofertas generosas em troca de falsos depoimentos ou ocultação de provas'.