Título: No berço do PT, militância indiferente
Autor: Paulo Baraldi e Marcelo Godoy
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/09/2005, Nacional, p. A7

Em São Bernardo do Campo, onde o PT nasceu, há 25 anos, os petistas votaram num ambiente de tranqüilidade raro para a legenda desde a eclosão da crise do mensalão, em junho. A calma só foi quebrada por um incidente, após a votação. Encerrada a votação, um protesto do militante Mauro Iasi, que votou e em seguida se desfiliou, gerou tumulto. ¿O presidente Lula está ausente do PT não é hoje não, está ausente dos princípios do partido, da origem do partido, do caráter do partido¿, atacou. Alguns tentaram agredi-lo. Houve insultos e empurra-empurra. Um homem tentou puxar do bolso um objeto, mas foi contido e afastado. Iasi acabou se retirando

. Do lado de fora da sede do partido, uma construção inconclusa de paredes brancas e portas vermelhas na esquina das Ruas Tapajós e Vianas, militantes disputaram os votos com muitos panfletos, poucas bandeiras e quase nenhuma palavra de ordem. Houve também provocações bem-humoradas, alusivas aos problemas éticos nos quais o partido mergulhou após as acusações do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), que teve o mandato cassado na semana passada.

¿Nessa história de cortar na carne, estamos oferecendo a navalha¿, gritou um ¿boqueiro¿ que pedia votos no candidato da tendência Articulação de Esquerda, Valter Pomar, brincando com Genival Inácio da Silva, o Vavá, de 65 anos, irmão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que fora votar no Campo Majoritário.

Otimista, Vavá disse que, se o irmão for candidato à reeleição, tem 90% de chances de vencer no primeiro turno. ¿A situação do País nunca esteve melhor¿, declarou. O irmão de Lula disse que sempre houve caixa 2 em campanhas, ¿desde 1913¿, e nunca acabará. ¿Se quero ter um candidato, vou e ajudo. O dinheiro é meu, dou para quem quiser.¿ Ele disse também que o governo sairá fortalecido da crise. ¿Mensalão sempre existiu.Qual é o vereador que se elegeu com o seu dinheiro? Todo mundo pega dinheiro dos outros.¿

Houve denúncias de transporte de eleitores e pagamento, pelo Campo Majoritário, da taxa de R$ 5 devida pelos filiados em atraso que queriam votar. Uma Kombi, de placas BTB-3480, com a estrela do partido e o nome da deputada estadual Ana do Carmo (PT), transportava filiados que iam votar e, depois, os levava embora. ¿Todo mundo está trazendo gente¿, defendeu-se a parlamentar, que reconheceu que mandara pagar as contribuições de petistas desempregados. ¿O que tem de acabar é com essa falsa moralidade. Nunca peguei nada de ninguém. Do meu salário, faço o que quiser.¿ O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, disse que o momento vivido pelo partido não é ruim, mas importante, e defendeu o deputado Professor Luizinho (SP), um dos acusados de receber recursos irregularmente. ¿Alguém imagina que o Luizinho, por conta de R$ 20 mil, iria se colocar numa situação constrangedora?¿ Segundo ele, a responsabilidade, no caso, é do ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares.

Já o deputado Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho, afirmou que ¿há uma tensão interna¿ no Campo e houve ¿erros políticos, que levaram a outros erros, mais graves¿.

OKAMOTO

Acusado de, numa operação suspeita, quitar uma dívida de R$ 29 mil do presidente Lula com o PT, o presidente do Sebrae, Paulo Okamotto, pediu punição para todos os petistas que cometeram deslizes. ¿Precisamos retomar a autoridade política¿, afirmou, após votar.

O ex-metalúrgico Elson Amaro de Jesus, de 47 anos, veterano das greves que geraram o PT, disse que votou em Pomar, porque, em sua opinião, é preciso reconstruir um partido ¿onde os filiados tenham influência nas decisões¿. ¿A gente sente que Lula está preocupado que se apure todos os desvios¿, disse o militante, antes do fim da votação, quando se constatou que Lula não votara.