Título: Uma Merkel triste e um Schroeder exultante
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Fonte: O Estado de São Paulo, 19/09/2005, Internacional, p. A12

Angela Merkel, líder da direita cristã, foi a melhor colocada nas eleições da Câmara Baixa do Parlamento. Seu partido, a União Democrata-Cristã/União Social-Cristã (CDU/CSU), bateu o partido rival, o Partido Social-Democrata (SPD), que dirige o país há sete anos, com Gerhard Schroeder. Simplesmente, a vitória de Merkel não tem nada de triunfal. Seu partido, mesmo com aliados, os liberais do Partido dos Democratas Livres (FDP), não terá maioria absoluta. No entanto, Angela Merkel proclamou a derrota dos sociais democratas e a vitória da CDU/CSU. Ele quer formar o novo governo. Conseguirá?

A própria CDU/CSU, sem admitir, duvida. No pódio dos vencedores, as expressões ontem eram tristes. Militantes desencorajados. Caretas. Dizia-se na surdina, às vezes com um sorriso maroto, que Merkel recebera uma belo tapa.

Ao contrário, no lugar do SPD, casa dos vencidos, há o júbilo. Quando Schroeder, o chanceler batido, chegou, houve uma grande ovação de três minutos. Schroeder, parado, encantado, fazendo o sinal de positivo, fala em vencer. Ele se diz orgulhoso. Ele pronuncia essa frase extraordinária: "Esta tarde, eu me sinto confirmado em minhas funções". E esclarece: "Não entendo como a CDU/CSU, que foi vencida, tem a arrogância de reclamar o poder!"

Portanto, os dois grandes partidos anunciam a vitória, os dois partidos exigem a chancelaria. Não existe muita lógica.

Se Schroeder decidiu em agosto dissolver a Câmara Baixa do Parlamento e convocar essas eleições, foi para esclarecer as coisas, para realizar as indispensáveis reformas econômicas e sociais. Bem, as coisas, longe de ficarem mais claras, estão cada vez mais obscuras.

Para sair desse impasse, a solução seria uma coalizão que associasse mais partidos ao governo. Sim, mas que coalizão? A combinação óbvia seria a "grande coalizão". A grande coalizão associaria os dois grandes partidos - a direita (CDU/CSU) e a esquerda (SPD). Mas isso seria mais ou menos como casar a água e o fogo, um casamento contra a natureza.

Primeiro obstáculo: qual chanceler? Merkel ou Schroeder? Não parece possível ver Schroeder trabalhando sob as ordens de Merkel. (Ele acaba de excluir essa possibilidade.) E o contrário também não parece possível. Segundo obstáculo: como conceber um programa construído por duas ideologias tão diferentes? Angela Merkel, que está à direita da CDU/CSU, quer fazer uma revolução liberal radical, inspirada no mínimo trabalhista Tony Blair e no máximo na conservadora Margaret Thatcher.

Ao contrário, o SPD, mesmo tendo entendido que faltou injetar liberalismo em uma economia enferrujada e gasta, não quer sacrificar o famoso modelo de bem-estar social. Portanto, a grande coalizão seria uma paralisia. Enquanto não encontrar outra solução, a Alemanha talvez tenha que se contentar com esta infernal coalização.

Pode-se conceber outros esquemas? As escolhas não são muito numerosas. Do lado de Merkel, a CDU/CSU associada ao seu aliado tradicional, os liberais do FDP, não retém a maioria absoluta. Será que conseguiria alguns outros apoios?

Ela poderia recorrer aos verdes. Mas estes são amigos da esquerda - o brilhante ministro das Relações Externas, Joshka Fischer, é um verde. É possível, no entanto, que alguns verdes se deixem levar.

Claro, há mais um partido, o Partido da Esquerda (Die Linke) - em forte ascensão, principalmente na antiga Alemanha Oriental. Mas o Die Linke está à esquerda da esquerda. Dissidentes do SPD, com o célebre Oskar Lafontaine, trotskistas, etc. Está fora de questão que a CDU/CSU passe um acordo com o Die Linke.

Do lado de Schroeder, quais combinações possíveis? O SPD, mesmo associado aos verdes, não reúne maioria absoluta. Então? O SPD poderia receber apoio da extrema esquerda, o Die Linke? Nada disso. Schroeder exclui essa possibilidade.

Portanto, se o SPD quer uma maioria absoluta, ele deveria se aliar aos verdes, por um lado, e também aos liberais do FDP. Na transição dessas duas formações - SPD e CDU -, o SPD seria então o árbitro.

É preciso esperar que os resultados completos sejam conhecidos e digeridos. Haverá discussões fundamentais entre os atores desse caos político. Mas desde esta tarde, uma conclusão se destaca.

O escrutínio, bem longe de tirar a Alemanha da confusão, de seus fracassos e de sua inércia, só aumentou a desordem.