Título: PF afasta 59 após roubo de R$ 2 mi
Autor: Clarissa Thomé
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/09/2005, Metrópole, p. C1

Cerca de R$ 2 milhões apreendidos na quinta-feira, com uma quadrilha internacional de tráfico de drogas que pretendia enviar 1,6 tonelada de cocaína em peças de carne para Portugal, foram roubados da sede da Polícia Federal no Rio. O dinheiro, em notas de euro, dólar e real, sumiu de uma sala-cofre sem sistema interno de câmeras ou sensor de movimento. O superintendente em exercício da PF, delegado Roberto Prel, admitiu a participação de policiais federais - ontem mesmo, 59 foram afastados de suas funções - e a possibilidade de o roubo ter sido cometido para desestabilizar a corporação. O dinheiro estava guardado, em sacos plásticos, nas prateleiras da sala-cofre. Entre a madrugada de domingo e a manhã de ontem, os ladrões subiram até o quarto andar, passaram pelo saguão interno (onde fica a entrada da sala-cofre) e atravessaram o corredor externo até a porta da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE).

Lá, entraram por uma porta de vidro e, com pés-de-cabra, arrombaram duas portas e o armário do escrivão, onde estava a chave da sala-cofre. Fizeram todo o caminho de volta, entraram na sala-cofre e levaram o dinheiro: 677.230, US$ 63.204 e R$ 21.905. Na guarita externa e na entrada da PF, ficam bonecos vestidos de policiais para dar a impressão de segurança reforçada no local - como os Ricardões que eram usados pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) nas Marginais em São Paulo.

O roubo indignou policiais que atuaram nas investigações da Operação Caravelas, que culminou na prisão de oito envolvidos com tráfico de drogas.

O chefe da Inteligência e Operações da Coordenadoria de Repressão a Entorpecentes de Brasília, Ronaldo Magalhães, chegava à superintendência às 8 horas, quando foi alertado por uma escrivã que a DRE havia sido arrombada. "Trabalhei por quase dois anos para a prisão dessa quadrilha. Fui da euforia ao luto."

Magalhães informou o roubo ao diretor-geral da PF, Paulo Lacerda. "A reação dele foi a mesma que a minha, de luto. O prejuízo não é para a investigação do tráfico, mas o nome da PF é que foi manchado." Prel se disse "constrangido".

Uma sucessão de erros permitiu o furto. A começar pelo fato de o montante não ter sido depositado em um banco imediatamente. Magalhães explicou que isso ocorreu porque havia dúvidas quanto à jurisdição do dinheiro apreendido - se deveria ser depositado em nome da 11ª Vara Criminal Federal de Goiânia, onde o inquérito teve origem, ou da 7ª Vara, do Rio.

Segundo Prel, os policiais da delegacia terão de explicar por que a chave do cofre estava no armário e o dinheiro não estava no caixa-forte em que fica armazenada a droga apreendida - onde a segurança é maior.

MOTIVO

O superintendente em exercício admitiu que o furto pode ter sido cometido para desestabilizar a administração da PF - em outubro, uma bomba de fabricação artesanal explodiu na sala do Núcleo de Operações da Delegacia de Defesa Institucional (Delinst), ferindo três agentes. Prel não quis ligar um caso ao outro. "A bomba havia sido apreendida e explodiu por erro no manuseio", afirmou.

Magalhães garantiu que não há disputa interna na corporação entre Rio e Brasília. "Se houvesse, eu chamava a Polícia Militar para fazer a prisão, em vez de dividir o trabalho com eles."

Equipes de Brasília viajaram para o Rio a fim de investigar o furto. As salas passaram por duas perícias. Prel informou que a PF alertou as instituições financeiras sobre o furto. Parte das notas havia sido fotocopiada, o que facilitará o trabalho de rastreamento. "É ponto favorável o fato de terem sido apreendidas notas de 500, cuja circulação não é comum no Brasil."

Na quinta-feira, a PF iniciou a Operação Caravelas: apreendeu 1,6 tonelada da droga em peças de carne congelada, carros, dinheiro e prendeu sete pessoas. Na sexta, a psicóloga Sandra Tolpiakow, sócia da rede de pizzarias Capricciosa e do restaurante Satyricon, foi presa. Segundo a PF, os estabelecimentos foram financiados pelo dinheiro da quadrilha.