Título: Emissão em real rende R$ 3,4 bilhões
Autor: Renata Veríssimo e Patrícia Campos Mello
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/09/2005, Economia & Negócios, p. B1

O governo brasileiro conseguiu captar ontem R$ 3,4 bilhões (cerca de US$ 1,5 bilhão) em títulos da dívida externa brasileira atrelados ao real. É a primeira operação do Tesouro Nacional com papéis de rendimento vinculado à moeda nacional. "Nós tivemos sucesso nessa colocação e atingimos o nosso objetivo que era de desenvolver um novo mercado de títulos em reais", disse o secretário-adjunto do Tesouro, José Antônio Gragnani, ao Estado.Segundo ele, a operação mostra a confiança do investidor no mercado brasileiro. "Mostra mais uma vez que o Brasil mudou e os fundamentos da economia são sólidos." O novo papel foi chamado de Global BRL 2016. A emissão foi coordenada pelos bancos Goldman Sachs e JP Morgan, tendo como cogerente o Banco Itaú.

Embora o Tesouro não confirme, na semana passada, o mercado especulava que a emissão seria entre US$ 500 milhões e US$ 700 milhões. A demanda pelo papel teria sido muito elevada, o que levou o governo a oferecer mais títulos. O novo título terá um custo para o governo de 12,50% ao ano e foi negociado com um pequeno deságio sobre o valor de face, o que vai garantir ao comprador um ganho de 12,75% ao ano. Os juros serão pagos ao investidor semestralmente, em janeiro e julho, até o vencimento do papel, em 2016.

Segundo Luiz Forbes, diretor da corretora López León, a demanda e os juros do papel foram surpreendentes. "O mercado esperava uma emissão de US$ 700 milhões, com vencimento entre 5 e 7 anos, e com juros de, no mínimo, 14%." Ele diz que os principais compradores foram investidores estrangeiros. "Não havia muitas opções para os estrangeiros que queriam investir em reais porque há muita burocracia para comprar papéis da dívida interna brasileira."

A emissão de títulos atrelados ao real interessa ao governo porque diminui o risco cambial da dívida externa. Até hoje, o Brasil só emitia títulos soberanos em moeda estrangeira, porque os investidores exigiam retornos proibitivos para papéis em real. Com isso, toda vez que havia uma crise e uma grande desvalorização do real, o valor da dívida externa explodia. Com papéis em reais, o governo não fica sujeito a essas flutuações. Nos papéis emitidos ontem, se houver desvalorização do real, a rentabilidade do investidor fica menor.

A Argentina é um bom exemplo desse risco: o país deu o calote em 2001 depois que o currency board (regime que mantinha paridade entre dólar e peso) entrou em colapso, o peso despencou e as dívidas em dólar explodiram. Na América Latina, a Colômbia, o México e o Chile já emitiram dívida externa em moeda local.

No Brasil, apenas grandes bancos brasileiros e a Eletropaulo haviam emitido títulos em reais no exterior, até agora. Ontem, seguindo o clima positivo, o Bradesco também anunciou emissão externa em reais.