Título: Às 18h30, despedida na tribuna
Autor: Lisandra Paraguassú
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/09/2005, Nacional, p. A7

Eleito numa sessão que avançou pela madrugada de 15 de fevereiro passado, o rei do baixo clero, Severino Cavalcanti (PP-PE), escolheu o fim de tarde de hoje para anunciar sua renúncia à presidência da Câmara e ao mandato parlamentar. Se cumprir o combinado com assessores e com o Palácio do Planalto, fará um discurso na tribuna às 18h30. Dirá que é vítima de preconceito e de uma conspiração de setores da oposição. Mas fatos concretos abreviaram seu mandato e desencadearam a sucessão.

Cercado de personagens envolvidos no esquema do mensalão, Severino capitaneou a tentativa de um acordão para livar da cassação os deputados que receberam dinheiro direta ou indiretamente das empresas do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza. O protagonismo de Severino revoltou a oposição a ponto do deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) dizer, em plenário, que ele era indigno do cargo.

Depois, abatido por denúncias de que recebera propinas do empresário Sebastião Buani, que explorava um restaurante na Casa, Severino percorreu em tempo recorde as etapas do desgaste político fatal.

Primeiro, negou tudo. Disse ser "mentira, mentira, mentira" as acusações de que recebera de Buani mensalinho para prorrogar ilegalmente o prazo de exploração do estabelecimento.

Confrontado com o aparecimento das provas, um extrato bancário e um cheque no valor de R$ 7.500 descontado por uma secretária do gabinete da presidência da Câmara, Severino disse que os valores eram empréstimos para a campanha a deputado federal de um filho seu falecido. Extratos da prestação de contas de Severino Filho, porém, desmontaram a versão.

Na tarde de ontem, Severino viveu, provavelmente, seu último dia como presidente da Câmara. Passou os olhos em anotações preparadas para o discurso e recebeu aliados na residência ofcicial, na Península dos Ministros. Os deputados Simão Sessim (PP-RJ), Pedro Corrêa (PP-PE) e Eduardo Gomes (PSDB-TO) estiveram na sua casa. "O achei bastante sereno e aliviado", disse Sessim. "Ele recebeu muitos apelos para que permanecesse no cargo, mas ele não quis correr o risco porque quer ser candidato no próximo ano", afirmou Corrêa.

A decisão de Severino trouxe alívio também para a família. A mulher do presidente da Câmara, dona Amélia, e a filha Ana, deputada estadual, defendiam desde o início que Severino renunciasse. Ontem, dona Amélia chegou a chorar na frente de parlamentares ao dizer que estavam destruindo a reputação de seu marido e a renúncia seria a melhor coisa.

Antes de renunciar, Severino negociou os termos de sua saída com o Planalto. Em encontro com Lula, na tarde de segunda-feira, o presidente da Câmara consegiu manter empregado seu filho José Maurício no ministério da Agricultura, e Márcio Fortes como ministro de Cidades.

Depois do combinado, o alívio. Severino mostrou-se sorridente e chegou a acenar para os fotógrafos que há dias sitiavam a casa.