Título: Seca no Madeira é ameaça de apagão
Autor: Agnaldo Brito
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/09/2005, Economia & Negócios, p. B13

A pior seca já registrada no Rio Madeira nos últimos 37 anos, um dos principais afluentes da margem direita do Rio Amazonas, põe em risco o abastecimento das termoelétricas movidas a óleo combustível instaladas em Rondônia e Acre, na Região Norte. A Eletronorte, em acordo com a Petrobrás, deflagrou a partir da semana passada um plano emergencial para o transporte de combustível da Refinaria de Manaus até Porto Velho (RO). Não é o único e nem o principal. O plano conta com uma operação de emergência que incluiu a transferência de combustível da Refinaria de Paulínia (Replan), no interior de São Paulo, como principal fornecedora de óleo para geração térmica, num percurso de 3 mil quilômetros.

Até agora, saíram de Paulínia em direção a Porto Velho 14 milhões de litros de óleo diesel, tanto para o abastecimento das térmicas quanto o abastecimento do transporte de carga e de passageiros. Por dia são necessários a chegada de pelo menos 1,3 milhão de litros de combustível. "Esse volume viria de Manaus não fosse a dificuldade de navegação no Rio Madeira", explica Fernando Fonseca, gerente regional de Rondônia da Eletronorte. O plano de guerra para assegurar o funcionamento de uma capacidade instalada de 380 MW (necessária para suprir de energia elétrica Rondônia e Acre) deu resultado. A Eletronorte afasta, por ora, qualquer risco de desabastecimento dos dois estados.

A rota Manaus-Porto Velho (na subida do Madeira) ainda funciona, mas precariamente. A Marinha já proibiu, por exemplo, o tráfego noturno em parte da hidrovia.

Segundo Fonseca, a BR Distribuidora consegue trazer apenas metade da capacidade de óleo diesel em barcaças, 1,5 milhão de litros de óleo ante os 3 milhões que subiam o rio por barcaça. Uma alternativa tem sido o transbordo em Manicoré, no meio do caminho, a 600 quilômetros de Manaus.

A BR Distribuidora faz o transbordo para embarcações menores capazes de passar em trechos rasos do Rio Madeira com menor risco de encalhe. O problema é que a operação também não está garantida. "Se o volume de água do Madeira cair ainda mais, acho que ficará impossível o transporte pelo rio", avisa Elpídio Gomes Filho, diretor-superintendente da Administração das Hidrovias da Amazônia Ocidental (Ahimoc). De acordo com ele, há 21 trechos críticos ao longo do rio, com profundidades de 1,50 a 1,80 metro de profundidade no canal de navegação. "Acho que o custo desta operação entre Paulínia e Porto Velho será de cinco ou seis vezes maior do o transporte por balsas entre Manaus e Porto Velho", explica.

De acordo com a Eletronorte o custo adicional do plano de emergência será todo custeado pela Petrobrás. "A Eletronorte não terá custo adicional algum. A Petrobrás é quem deve garantir o abastecimento", disse Fonseca. O plano em curso é o único capaz de assegurar o fornecimento na região. O Sistema Elétrico Rondônia/Acre é isolado, não tem ligação com o Sistema Interligado Nacional (SIN). Isso deverá ocorrer apenas em 2007, quando a Eletronorte avalia que terá condições de concluir um linha de 300 quilômetros que interligará os municípios de Vilhena (Sul de Rondônia) a Jauru (MT). "Se existisse essa ligação poderíamos receber energia do Sudeste ou Nordeste, mas ela somente estará pronta em 2007", diz Fonseca.

ALERTA

Segundo Inácio Azevedo, diretor técnico da Companhia Elétrica de Rondônia (Ceron), vigora neste momento o estado de alerta", mas não há nenhum plano de racionamento em marcha. A situação do rio, que em alguns trechos - segundo o administrador da hidrovia tem profundidade máxima de 1 metro e 50 centímetros -, não deve permanecer no atual nível. O período de chuvas começa a partir de meados de outubro pode elevar o nível e normalizar a situação. É a crença do grupo gestor que acaba de ser criado para enfrentar a situação.

A principal contribuição para formação do Rio Madeira vem do degelo da Cordilheira dos Andes. Alguns canais que atravessam a Bolívia levam água até o território brasileiro. A partir de Porto Velho o rio torna-se navegável e ingressa na chamada Planície Amazônica.

Segundo Gomes Filho, administrador da hidrovia, a contribuição da água que desce da Cordilheira é fundamental para empurrar a água em direção ao Rio Amazonas. O declive na planície é mínimo. Para se ter uma idéia, o desnível de Porto Velho até a foz no Rio Amazonas (1.056 quilômetros) é de só 19 metros, queda de menos de 2 centímetros por quilômetro.