Título: Brasil sai da tela do FMI e do Bird
Autor: Rolf Kuntz
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/09/2005, Economia & Negócios, p. B3

O Brasil está fora do visor do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (Bird), muito mais ocupados com os problemas dos países mais pobres, na maioria africanos, com os perigos criados pelo déficit externo dos Estados Unidos e com a alta dos preços do petróleo. A decisão de perdoar a dívida de US$ 55 bilhões das economias mais pobres com as entidades multilaterais foi o resultado prático mais importante da assembléia anual das duas instituições, encerrada ontem. Numa rara referência ao País, o presidente do Bird, Paul Wolfowitz, disse no meio de um longo discurso que o banco ¿vai fortalecer a cooperação com os sócios de renda média, como Brasil, China, Índia, México e África do Sul, que enfrentam crescente demanda de energia¿.

Houve muita discussão, durante a semana, sobre o risco de ajuste abrupto da economia internacional: o déficit externo dos EUA passa de US$ 600 bilhões e tende a crescer, há pouco investimento no mundo, a moeda chinesa continua subvalorizada e os juros estão em níveis historicamente baixos.

A economia global continua a crescer vigorosamente, mas em condições insustentáveis por muito tempo, segundo economistas do FMI, do Bird e dos maiores bancos internacionais. O alerta mais ouvido em Washington durante a semana foi: é preciso cuidar dos problemas logo para evitar uma correção atabalhoada.

O fato mais positivo para o Brasil e outros países de renda média, nesta reunião, foi a forte cobrança de resultados na Rodada Doha de negociações comerciais. A importância de resultados concretos na próxima Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), marcada para dezembro em Hong Kong, foi acentuada em todos os pronunciamentos mais importantes e em todos os comunicados de comitês e de grupos de países.

O novo diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, discursou duas vezes e alertou para as conseqüências de mais um fiasco em Hong Kong ¿ a rodada já derrapou há dois anos na conferência de Cancún, no México.

Hong Kong, disse Lamy, não será apenas mais uma parada para balanço. Será a última e melhor chance de uma rodada bem-sucedida até o final do próximo ano. Sem isso, disse, o mundo enfrentará o risco de protecionismo crescente e a economia global ficará mais frágil.

Para Wolfowitz, a reforma do comércio agrícola, com maior abertura dos principais mercados, deverá beneficiar sobretudo os pequenos produtores do mundo pobre.

O problema da agricultura brasileira em relação ao comércio internacional é um tanto diferente. Os exportadores, tanto grandes quanto pequenos produtores, são em geral muito mais modernos e produtivos que os da maior parte do mundo em desenvolvimento. Mas Palocci tomou carona nessa defesa dos mais pobres, um dos grandes motes da semana.

Lembrou que o êxito na Rodada Doha poderá resultar, na altura de 2015, em ganhos anuais de US$ 250 bilhões para as economias em desenvolvimento, segundo cálculos do Bird. Calcula-se que boa parte desses ganhos irá para as menores economias. Os US$ 250 bilhões representarão mais que a ajuda prometida pelos ricos em Monterrey, 0,7% de seu Produto Interno Bruto, acrescentou Palocci.

O Bird e o Fundo se dispuseram a ampliar a assistência técnica e financeira aos países pobres para que possam ajustar-se aos compromissos de liberalização comercial.