Título: Em 8 meses, R$ 105 bilhões de juros
Autor: Isabel Sobral
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/09/2005, Economia & Negócios, p. B1

Ciclo de alta da Selic provoca pagamento correspondente a 8,39% do PIB de janeiro a agosto, o mais alto da história para o período

Dados divulgados ontem pelo Banco Central (BC) mostram que a despesa do setor público brasileiro com o pagamento de juros atingiu R$ 105,68 bilhões de janeiro a agosto deste ano. Correspondente a 8,39% do Produto Interno Bruto (PIB), essa foi a carga mais alta da história para esse período. O gasto recorde com juros reflete o ciclo de alta da taxa Selic, iniciado pelo BC em setembro de 2004 e interrompido apenas neste mês com a redução da taxa, de 19,75% para 19,50% ao ano. Nos oito primeiros meses de 2005, o setor público também conseguiu economizar um recorde de R$ 78,93 bilhões nas contas da União, Estados, municípios e empresas estatais, antes do cálculo dos juros, o equivalente a 6,2% do PIB. Mas o peso dos juros fez com que nem mesmo essa economia - chamada no jargão econômico de superávit primário - impedisse a elevação da dívida pública, que atingiu R$ 973,65 bilhões no fim de agosto. Esse valor correspondeu a 51,7% do PIB. Em julho, representava 51,5%.

Somente em agosto os juros somaram R$ 13,42 bilhões, 10,6% mais do que em julho. No período de 12 meses encerrados em agosto, a conta chega a R$ 150,15 bilhões, outro recorde desde o período anual terminado em novembro de 2003.

A relação entre a dívida pública e o PIB é um dos indicadores mais importantes usados por analistas e investidores para avaliar o grau de vulnerabilidade da economia. O nível de 51,7% em agosto é o mesmo de dezembro de 2004, embora nesses oito meses o setor público tenha acumulado recordes sucessivos de superávit primário. Entre janeiro e agosto do ano passado, por exemplo, o superávit havia sido de R$ 63,72 bilhões. O superávit realizado neste ano foi 23% maior.

O chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes, observou que a situação seria pior se o esforço fiscal não tivesse sido tão forte. "Os superávits primários serviram para que o indicador (trajetória da dívida com o PIB) ficasse equilibrado", disse ele, acrescentando que a projeção para o fim do ano é que a relação entre a dívida e o PIB tenha um pequeno recuo, para 51,5%.

Segundo Lopes, hoje a dívida líquida do setor público é mais sensível às variações na Selic do que ao câmbio, diferentemente do que ocorria. Isso acontece porque 52,5% do total de títulos da dívida pública mobiliária são corrigidos pela Selic.

De acordo com os dados do BC, em dezembro de 2002 - um mês antes da posse do governo Lula - a dívida cambial era de 39% do total, ante 45,4% atrelados à Selic. O objetivo, no entanto, é aumentar a parcela da dívida prefixada - que alcançou 22,6% em agosto, ante apenas 1,5% no fim de 2002 -, pois os juros são acertados antecipadamente, o que facilita a administração da dívida pelo Tesouro.

Lopes salientou ainda que a relação dívida/PIB também foi afetada pelo Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI), que há quatro meses seguidos apresenta deflação. Em agosto, o IGP-DI ficou em -0,79%. Esse índice, calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), é utilizado pelo BC para projetar o valor do PIB. Como tem sido negativo, ele reduziu o PIB projetado para o ano, fazendo com que se elevasse o indicador dívida/PIB.