Título: Governo apressa megaprojeto de satélites que custará US$ 1,5 bi
Autor: Ethevaldo Siqueira
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/09/2005, Nacional, p. A14

Um projeto estatal maior que o Sistema de Vigilância da Amazônica (Sivam) - podendo custar ao País mais de US$ 1,5 bilhão - está em marcha acelerada. Os maiores fornecedores mundiais de tecnologia, equipamentos e sistemas de satélites geoestacionários receberam recentemente do governo brasileiro um documento 34 páginas, formalizando o pedido formal de informações (Request for Information, RFI) sobre o projeto do Satélite Geoestacionário Brasileiro (SGB). Com base no documento, a que o Estado teve acesso com exclusividade, conclui-se que o governo quer tornar irreversível o processo de implantação do projeto até 2006. Embora o País já conte potencialmente com mais de 50 satélites geoestacionários autorizados a operar em seu território, o governo brasileiro, por intermédio do Comando da Aeronáutica, defende a necessidade de levar avante o megaprojeto que prevê o lançamento de três satélites - sendo o primeiro deles em 2009.

O documento distribuído aos potenciais fornecedores internacionais solicita informações e comentários que permitam o aprimoramento do projeto do SGB - denominado também Sistema de Satélites de Múltiplas Missões. Esses satélites darão apoio a vários setores governamentais em áreas e aplicações como gerenciamento de tráfego aéreo, meteorologia, aplicações estratégicas nacionais, defesa, segurança nacional e vigilância da Amazônia.

Além desses objetivos, o projeto prevê a construção de centros e redes com outros objetivos, como: centro de controle de tráfego aéreo, rede de sistema de navegação via satélite (GPS), rede terrestre de circuitos de comunicações, redes terrestres e terminais móveis para cada aplicação e, finalmente, a construção de infra-estrutura, incluindo telefonia, energia e ar condicionado.

TRÊS SATÉLITES

No projeto inicial, era previsto o lançamento de dois satélites geoestacionários, com custo orçado em US$ 637 milhões apenas no segmento espacial. Esse investimento deveria ser ressarcido em cerca de cinco anos, com base na suposta economia no pagamento dos serviços telefônicos e outros serviços de telecomunicações pela União.

Na fase atual, o projeto prevê o lançamento de três satélites, elevando o investimento no segmento espacial - incluindo satélites e foguetes lançadores -, que poderá chegar próximo de US$ 1 bilhão. A esse montante, deve ser adicionado o investimento na infra-estrutura terrestre, que envolve centros de controle e estações terrestres, elevando o custo total do projeto a mais de US$ 1,5 bilhão.

Segundo especialistas que trabalham no projeto, o satélite geoestacionário atenderá às necessidades dos serviços de trafego aéreo, "com base em acordos internacionais e aplicações tecnológicas existentes" - além de ser utilizado em comunicações para fins de segurança nacional e defesa civil, entre outras. O satélite poderá operar em conjunto com dispositivos como sensores meteorológicos.

Os dois primeiros satélites deverão dispor de bandas de freqüência C (largamente utilizadas para TV e telefonia), banda L (comunicação móvel) e banda X (comunicações militares). O terceiro satélite deverá contar com transponderes em banda Ku (para altas freqüências, de 14 e 12 GHz), competindo diretamente com os satélites comerciais privados, além de sistemas produtores de imagens meteorológicas de redundância do satélite americano GOES.

Nos estudos de viabilidade econômica, foram considerados praticamente todos os gastos com telefonia e outras formas de telecomunicações das repartições públicas federais, Forças Armadas, de empresas estatais, governos estaduais e municipais. Esses serviços, hoje providos por empresas privadas de telecomunicações, deverão ser atendidos pelo SGB, em áreas como as de comunicações aeronáuticas, coleta e difusão de informações meteorológicas, comunicações militares e de segurança nacional.

O programa SGB faz parte do Programa Nacional de Atividades Espaciais, aprovado pela Agência Espacial Brasileira (AEB). A Atech Tecnologias Críticas - integrada por militares reformados - foi a empresa responsável pelo projeto de viabilidade do SGB, conforme contrato com a Aeronáutica. Seu presidente é Tarcísio Takashi Muta. A Atech trabalha agora na especificação, em parceria com a Fundação Casimiro Montenegro, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD) e o Centro Técnico Aeroespacial (CTA).

INTERCÂMBIO

Além da prestação de serviços para a área estatal, os autores do projeto apresentam as vantagens e objetivos que, em sua opinião, justificariam o investimento. Essas vantagens se resumem ao desenvolvimento de competência brasileira em pelo menos três áreas estratégicas: tecnologia espacial, telecomunicações e meteorologia.

Um dos pontos de apoio tecnológico é a experiência da Atech, cuja competência não é posta em dúvida por ninguém nas áreas especializadas. A empresa, com 500 funcionários, é responsável pelo desenvolvimento de sistemas que controlam 90% do espaço aéreo brasileiro.

Por seu trabalho em projetos estratégicos como o do Sivam, a Atech deverá ter papel relevante na absorção de tecnologia, tanto na área de satélites, de infra-estrutura de comunicações terrestres e foguetes lançadores. Nesse intercâmbio com os fornecedores e organismos internacionais, argumentam os defensores do projeto, "o Brasil deverá absorver conhecimento e competência em projetos de telecomunicações espaciais", beneficiando instituições como o CTA, a Base de Lançamentos de Alcântara, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e a própria Atech.

É claro que os maiores argumentos em favor do SGB dizem respeito à soberania do Brasil e a questões estratégicas e de segurança, já que, na visão dos líderes do projeto, "o País precisa reduzir seu grau de dependência de tecnologias importadas, em especial numa era em que a tecnologia da informação e do conhecimento desempenha papel crucial e decisivo".