Título: O Kumon não pára de crescer
Autor: Renata Cafardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/10/2005, Vida&, p. A13

Empresa de ensino já é a 2.ª franqueadora do País, mas, para escolas, método estimula apenas o 'decoreba'

Uma mãe conversa com outra na porta da escola, que conta para a amiga também preocupada com as notas do filho, que indica para mais uma. Assim cresce no País o método de ensino Kumon, nascido no Japão em 1954. Escolas não recomendam, professores e matemáticos torcem o nariz, mas, nos últimos cinco anos, o aumento no número de alunos foi de 75%; hoje eles são 120 mil. Quase sem publicidade alguma, a empresa já é a segunda maior franqueadora no Brasil. Começou ensinando matemática e agora oferece português, inglês, japonês e - em 2006 - espanhol. As apostilas do Kumon têm exercícios que vão dos mais elementares aos complexos. Na medida em que o estudante vai acertando as respostas, ele passa para a apostila seguinte. São exemplos com exercícios resolvidos - e não professores - que indicam o que fazer, como fazer. Seus seguidores falam em autodidatismo, conseguido por meio de superação de dificuldades e da disciplina, tal como rege a cultura oriental.

Não há lousa nem aulas tradicionais numa unidade de Kumon. Os alunos chegam, buscam numa prateleira a apostila da vez e fazem seus exercícios, quietos e sozinhos. "O material é auto-instrutivo e não tem parte teórica", diz a gerente da filial São Paulo, Márcia Augusta Torres. Os donos das franquias não precisam ser educadores, mas passam por treinamento que os habilita a corrigir as tarefas.

ORIGEM

A história começou com um japonês, Toru Kumon, que queria ajudar seu filho com notas ruins em matemática. Ele criou o método e atraiu outros alunos preocupados com o desempenho escolar. Atualmente, são 1,5 milhão no Japão, outros 1,6 milhão na Coréia e 194 mil nos Estados Unidos e no México. Um pastor de Londrina (PR), que havia viajado para o Japão, trouxe a idéia para o Brasil em 1977.

Hoje há todo tipo de aluno no Kumon. Meninos como Rafael Tissianelli, de 14 anos, para quem a escola apenas não foi suficiente. "Desde pequeno ele ajudava as irmãs mais velhas com lições de matemática. Eu percebi que ele precisava de mais", diz mãe, Ligia. Rafael já faz exercícios correspondentes ao conteúdo do 1º ano do ensino médio, apesar de cursar a 7ª série.

Há outros, como Guilherme Nassim, que aos 16 anos nunca tinha lido um livro porque "não gostava e lia muito devagar". Agora, nas apostilas de português do Kumon, só vê texto, texto e depois, perguntas sobre o texto. "Cansa, mas estou melhorando." Também há gente como dona Inês Bottiglia, uma italiana de 78 anos, que resolveu fazer exercícios de matemática para "a cabeça trabalhar". Já Rosa Taba, de 30 anos, formada em Comércio Exterior, vê no Kumon uma maneira de melhorar o raciocínio para passar em concursos públicos.

"Somos radicalmente contra o Kumon porque o método só faz os alunos decorarem os procedimentos", diz a diretora do Centro de Aperfeiçoamento do Ensino da Matemática (Caem) da Universidade de São Paulo (USP), Martha Salerno Monteiro. Segundo ela, a má formação de professores que atuam em séries iniciais é a culpada pela falta de motivação das crianças pela disciplina, o que acarreta um mau desempenho escolar.

Por temer um trauma futuro, a corretora Vanessa Hocken colocou os dois filhos - bons alunos - no Kumon. O mais velho, Alexander, de 9 anos, multiplica de cabeça números de quatro algarismos. Mais entediado, Cristiano, de 6, demora dois minutos para completar um tabuleiro de 30 números, numa atividade oferecida às crianças pequenas.

"Importa menos a compreensão e mais a habilidade", diz o especialista da Faculdade de Educação da USP, Vinicio de Macedo Santos. Segundo a professora de matemática do Escola Eugênio Montale, Raffaella Pezzilli, as crianças que fazem Kumon têm dificuldade em aplicar a matemática no seu dia-a-dia. "Elas só aprendem os números. Quando questionadas quantas rodas há em quatro carros na garagem ao lado, não sabem responder."

Mesmo com pouquíssima publicidade, o Kumon só perde para O Boticário em número de unidades de uma mesma marca. São mais de 2 mil. Está na frente do McDonald's e das escolas Fisk . O mais freqüente e quase único material de divulgação são panfletos distribuídos em portas de escolas. Um franquia do Kumon custa entre R$ 3 mil e R$ 5 mil. Os alunos pagam mensalidade que vão de R$ 100 a R$ 120.