Título: Igreja quer castidade de seminarista nos 3 anos anteriores à ordenação
Autor: Ricardo Westin
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/10/2005, Vida&, p. A38

Ter alguma vez tido relações sexuais com homens não impedirá necessariamente que um jovem freqüente o seminário. A proibição de que gays se tornem padres valerá para os homens que tiveram relações homossexuais somente durante os três anos anteriores à ordenação. Divulgado ontem pelo jornal Il Corriere della Sera e pela revista Panorama, ambos da Itália, esse é um dos poucos detalhes até agora conhecidos da instrução de 16 páginas que o papa Bento XVI tornará pública no início de novembro, deixando mais rígidos os critérios para a admissão nos seminários.

Pelas leis católicas, manter-se em castidade é obrigação de todos os sacerdotes, independentemente da orientação sexual. Na avaliação da Igreja, os padres homossexuais são "mais fracos e passam com mais facilidade do pensamento para a ação" do que os heterossexuais.

A nova instrução também estabelece que não serão admitidos aqueles que manifestarem uma "atração invencível" ao mundo homossexual publicamente - assumindo sua preferência sexual ou freqüentando reuniões ou clubes gays - ou na intimidade, dentro do próprio quarto - vendo filmes, lendo livros ou acessando páginas da internet. Esse tipo de comportamento excluirá do seminário inclusive os postulantes que, apesar da orientação, nunca tenham tido relação sexual.

Até o momento, não está claro de que forma os reitores dos seminários conseguirão reconhecer os gays. De acordo com psicólogos, nem sempre é possível identificar um homossexual avaliando apenas seu comportamento em público. A maneira mais segura é a autodeclaração, algo improvável, já que significaria a expulsão do seminarista.

Para ter credibilidade, segundo as duas publicações italianas, a instrução do Vaticano virá acompanhada da avaliação de um psicólogo "de renome mundial". Esse embasamento científico será publicado no L'Osservatore Romano, o diário oficial da Santa Sé.

REFORÇO DA TRADIÇÃO

A nova instrução reforça a posição tradicional do Vaticano em relação a seminaristas e padres gays. Um documento de 1961, Instrução sobre o Cuidado na Seleção e no Treinamento de Candidatos aos Estados de Perfeição e às Ordens Sagradas, já deixava claro que eles não devem fazer parte da vida religiosa. Segundo a Igreja, relações homossexuais são "intrinsecamente anormais".

A ordenação de homossexuais sempre foi debatida na Santa Sé, mas passou a merecer mais atenção em 2002, quando começaram a surgir escândalos de pedofilia nos EUA envolvendo padres e meninos.

Um padre homossexual, que falou ao Estado sob a condição de que seu nome não fosse divulgado, disse que a instrução terá efeitos negativos sobre os futuros padres. "Não acredito que seja essa a saída para resolver problemas como a pedofilia. Os candidatos ao seminário vão mentir e se reprimir. Poderão se tornar mal resolvidos e problemáticos. Ou seja, péssimos sacerdotes."

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) informou que a nova instrução não será posta em prática ao pé da letra. O bispo d. Anuar Batisti, presidente da Comissão Episcopal para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada, diz que gays podem se tornar padres. "Mas terão de fazer uma transformação, mudar suas convicções."