Título: Especialista acha exigência escolar de pouca relevância
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/10/2005, Nacional, p. A15

Presidente do Iets diz que condição já é cumprida, pois 'na faixa de 7 a 14 anos está praticamente todo mundo na escola'

A condicionalidade educacional do Bolsa Família tem pouca relevância, para Simon Schwartzman, presidente do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), no Rio. "Na faixa de 7 a 14 anos, já está praticamente todo mundo na escola", diz ele, referindo-se à idade das crianças cuja freqüência escolar é monitorada para efeito do cumprimento das condicionalidades do Bolsa Família (o intervalo, na realidade, é de 6 a 15 anos). A importância que Schwartzman atribui à ampliação dos recursos públicos para melhorar a educação básica faz com que veja com alguma reticência o grande aumento recente das dotações do Bolsa Família.

Em relação à condicionalidade educacional do Bolsa Família, é um fato que hoje o porcentual de crianças brasileiras de 7 a 14 anos que estão no ensino fundamental está na faixa de 97% a 98%. Assim, de acordo com aquele raciocínio, toda uma complexa estrutura de monitoramento está sendo montada para fiscalizar uma condicionalidade que é espontaneamente cumprida pela população.

IMPACTO

Rosani Cunha, secretária nacional de Renda da Cidadania, e gestora do programa Bolsa Família, observa, porém, que a condicionalidade do programa não é apenas de que as crianças estejam matriculadas na escola, mas sim de que tenham uma freqüência mínima de 85% da carga horária mensal. Ela diz que o cumprimento da condicionalidade do Bolsa Família "garante um melhor aproveitamento escolar e tem impacto na segurança alimentar e na questão do trabalho infantil".

Uma posição intermediária é a do economista Marcelo Neri, chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) no Rio. Neri, um defensor do Bolsa Família, concorda, porém, que a relevância da condicionalidade educacional é enfraquecida pelo fato de que a esmagadora maioria das crianças naquela faixa etária já está na escola.

Neri defende a idéia de que o Bolsa Família deveria se voltar para as faixas escolares abaixo e acima da atual - a pré-escola e o ensino médio. O economista observa que no Brasil é exatamente no ensino médio que há grandes taxas de abandono da escola. Para ele, o governo deveria incentivar os jovens a perseverar nesta etapa da educação.

Quanto à pré-escola (que nos conceitos mais avançados hoje pode começar até com menos de um ano, mesclando-se à creche, especialmente no caso de populações carentes), Neri diz que a pesquisa moderna vem mostrando que ela tem um impacto poderosíssimo no futuro desempenho escolar e profissional da pessoa, na sua renda futura e na redução da probabilidade de eventos indesejáveis como gravidez adolescente, crime e dependência do Estado.

Ele pondera que talvez não seja realista pensar numa condicionalidade do programa para crianças e adolescentes naquelas faixas , isto é, cancelar o benefício caso não haja freqüência à pré-escola e ao ensino médio. Na verdade, não há oferta de pré-escola para todos os brasileiros, e a evasão no ensino médio é um fenômeno social que não vai acabar de uma hora para outra. Mas Neri acha que o Bolsa Família poderia introduzir incentivos, como talvez um aumento do benefício para famílias com crianças na pré-escola e no ensino médio.