Título: 'Não ponham a culpa no eleitor!'
Autor: Gabriel Manzano Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/10/2005, Nacional, p. A8

Cientista político adverte: corruptos são eleitos pelos pobres e também por ricos

A naturalidade com que políticos praticam corrupção e depois cogitam de renunciar decorre da certeza de que seus eleitores o reconduzirão ao cargo na eleição seguinte - e não falta quem veja nisso um sinal de que o eleitorado brasileiro vota, muitas vezes, mal. "Essa idéia é muito elitista", adverte o cientista político Marcus Figueiredo, um dos diretores do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj). "O comportamento moral dos políticos não pode ser creditado aos eleitores. Os de cima erram, e os de baixo são os responsáveis? Claro que não." Contra os mensalões, renúncias e irregularidades na política, ele recomenda: "A quebra da ética política combate-se com política. A quebra da ética moral, a corrupção, combate-se com a justiça". O pouco interesse por política, e os baixos índices de alfabetização e o clientelismo significam que o brasileiro vota mal?

Não há nenhuma relação entre esses fatos. O comportamento moral dos parlamentares não pode ser creditado aos eleitores. Na lista de mensalões e mensalinhos há parlamentares com votos da elite social, da classe média e baixa. Com votos de intelectuais e semi-alfabetizados.

Se o Brasil tivesse investido mais em educação, nos últimos 10 ou 15 anos, o perfil médio dos políticos seria de menos corruptos?

Associar níveis de educação da população com níveis de corrupção é transferir para o eleitor a responsabilidade pelo comportamento dos corruptos. O eleitor em geral faz boas escolhas. Algumas vezes erra. Foi assim com Jânio, Collor e outros que traíram seus eleitores. O preço que eles pagam é não ter mais voto. A maioria dos parlamentares cassados por corrupção não voltou. Há alguns anos, as lideranças do PSOE, na Espanha, caíram em desgraça, por causa de corrupção no partido. Caso semelhante aconteceu na Alemanha, com Helmut Khol. Eles foram punidos pelo eleitor.

Como fazer para controlar esses abusos dos políticos?

Só há um modo de inibir a corrupção na política: ter uma legislação severa e controles eficientes. Hoje, cortar uma árvore sem autorização do Ibama tem punição mais severa do que receber mensalão. Cortar uma árvore é crime inafiançável, receber propina não!

O clientelismo é uma porta de entrada para a corrupção?

A prática do clientelismo não é necessariamente corruptiva. Um deputado fazer emendas para creches, campo de futebol ou bica d'água significa o atendimento de carências sociais. Esse tipo de clientelismo pode facilitar práticas de corrupção mas isso ocorre também na prática do clientelismo de atacado, na construção de grandes obras, estradas. O eleitor troca um voto por uma dentadura não porque é ignorante, analfabeto ou corrupto, mas porque ele é carente. Por isso é injusto pôr a culpa no eleitor.