Título: A Mesa fez a coisa certa
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Fonte: O Estado de São Paulo, 13/10/2005, Notas e Informações, p. A3

A decisão da Mesa da Câmara, por 5 votos a 1, de encaminhar ao Conselho de Ética pedido de abertura de processo por quebra de decoro parlamentar contra 13 deputados citados no relatório conjunto das CPIs dos Correios e da Compra de Votos tornou acadêmica a discussão sobre o direito (ou o dever) do colegiado de tratar da questão caso a caso. Serviu ainda para mostrar que o presidente da Câmara, o ex-ministro Aldo Rebelo, do PC do B, para decepção dos 6 petistas arrolados pelas CPIs, sabe se conduzir à altura do cargo para o qual foi eleito há pouco. Embora tivesse se manifestado enfaticamente a favor do exame caso a caso, deixou os demais membros da Mesa à vontade para agir como lhes aprouvesse. Mantenha-se ele assim até o fim do seu período e a Câmara terá dado um salto da noite para o dia, depois do confrangedor reinado de Severino, o Breve.

A Mesa, em suma, apreciou em bloco o parecer da Corregedoria da Câmara, endossando o relatório das CPIs. Tomada a decisão, ficou de preparar 13 relatórios individualizados a serem encaminhados amanhã ao presidente do Conselho, deputado Ricardo Izar. Este prometeu instaurar os processos impreterivelmente às 18h01 da segunda-feira. Ou seja, aqueles acusados que não renunciarem até lá, se forem cassados - ao fim e ao cabo de um circunstanciado ritual cuja etapa derradeira serão as votações secretas em plenário -, ficarão inelegíveis até 2015. (A suspensão dos direitos políticos por 8 anos começa a contar em 2007, quando termina a presente legislatura.) Sinal de seriedade dos procedimentos no Conselho, por decisão de Izar nenhum dos 13 relatores poderá ser do mesmo partido ou do mesmo Estado do réu sobre o qual lhe tocará dar parecer sobre a sua culpa ou inocência. Está claro, portanto, que não se sustenta a versão desde logo apresentada pelos deputados petistas que pendem para a renúncia - como quer o presidente Lula.

Com o impensado apoio do agora presidente eleito do partido, o ex-ministro Ricardo Berzoini, vários deles saíram dizendo que o processo no Conselho de Ética será uma farsa, uma caça às bruxas, cujo desfecho será um só, a cassação, mesmo quando cada qual tiver demonstrado a sua inocência. E tanto não deverá existir essa modalidade de tribunal de exceção de que falam os renunciantes, com a cara de pau típica dos políticos tentando justificar o injustificável, que é dada como certa a absolvição de 3 dos 16 (Pedro Henry e Vadão Gomes, do PP, e Wanderval Santos, do PL). Dos petistas, pelo menos um, Professor Luizinho, conta com a absolvição, se não no Conselho, no plenário. Para induzi-los à renúncia - decerto a fim de reduzir o risco de aparecimento de novos fatos indigestos para o governo, durante os processos que poderão se estender por 90 dias, sem contar o epílogo em plenário -, Lula assegurou aos companheiros que o PT não lhes negará legenda para voltarem a se candidatar em 2006.

Pena, para as intenções de Lula e para os eventuais renunciantes, que o ex-ministro José Dirceu não só se recusou a renunciar quando ainda podia (o processo contra ele já está em curso), como alegou que a renúncia equivaleria a uma confissão de culpa. Se assim é, a família petista, para não falar do eleitorado, não poderá fugir à conclusão de que o que vale para ele, segundo suas próprias palavras, vale para os outros.

Para a sociedade que vem assistindo bestificada às revelações sobre o jeito petista de fazer política, toda renúncia será um ato execrável. Não só porque os culpados devem pagar pelo que fizeram, no mínimo com a cassação e o banimento da vida pública por um decênio - nada ofende mais os brasileiros do que a impunidade dos poderosos -, mas também porque cada renúncia será um processo a menos, e quanto mais numerosos forem os juízos em curso no Conselho de Ética, maior, em princípio, a chance de se aprofundar o conhecimento do que foram os escândalos sem precedentes englobados no termo mensalão. A tal ponto interessa a busca da verdade sobre a lambança promovida pelo PT, que, se fosse possível, valeria transpor para o âmbito parlamentar o instituto da delação premiada.

No limite, até a absolvição seria um preço razoável a pagar por um retrato completo dos delitos cometidos no Planalto nesses últimos anos, com a identificação dos que os praticaram, dos seus mentores e dos que, podendo impedi-los, preferiram olhar para o outro lado.