Título: 'Podem me cassar, mas vou fazer política até morrer'
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Fonte: O Estado de São Paulo, 13/10/2005, Nacional, p. A5

O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu disse ontem que mesmo que tenha seu mandato cassado, vai 'continuar fazendo política já no dia seguinte'. Em entrevista à Rádio Eldorado AM, de São Paulo, ele garantiu: 'Vou continuar fazendo política até morrer, não vou parar nenhum minuto (...), mesmo fora do Parlamento, fora de poder ser membro do governo, de poder ocupar cargo eletivo.' Dirceu contou na entrevista que seu maior arrependimento, nos 29 meses em que esteve no poder, foi 'não ter saído do governo na hora certa'. Ele confessou que seu maior medo é da mentira - e garantiu, na conversa, que 'raramente' mente.

Ele reafirmou - como em várias outras vezes - que não existem provas que justifiquem sua cassação. A seu ver, tudo não passa de 'um processo político de condenação do PT, do governo Lula, de uma parte da história da esquerda'. Repetiu explicação já dada antes: 'Se trata do que eu represento.'

O deputado recorreu ao Superior Tribunal Federal (STF) contra o processo de cassação de seu mandato por achar que não pode ser julgado por quebra de decoro parlamentar enquanto chefiava a Casa Civil.

'Se tem um suplente no meu lugar, como é que eu sou deputado?', argumentou. 'Eu fui ao Supremo porque é um direito meu. Independentemente disso eu repito que sou inocente', disse. 'Não há provas de que eu organizei, chefiei ou participei de um suposto mensalão.'

Desde que saiu do governo - em 16 de junho, dois dias depois de o então deputado Roberto Jefferson denunciar o mensalão, em depoimento ao Conselho de Ética da Câmara - e voltou a ser deputado, ele se diz 'tranqüilo'. Vem sendo tratado 'até pela oposição' com respeito.

'Na Câmara todos os deputados e deputadas sabem que não existia mensalão e que eu não participei. Todos sabem', enfatizou.

Maior medo é a mentira, afirma. E diz que só mente 'raramente'

'Não pus um centavo no bolso, sou uma pessoa honesta.' A responsabilidade pela crise no PT, segundo Dirceu, é da direção que assumiu em dezembro de 2002. 'Enquanto fui presidente, o PT prestou contas (dos gastos de campanha).'

Os empréstimos dos Bancos Rural e BMG, envolvendo o empresário Marcos Valério, 'repassados pelo (ex-tesoureiro do PT) Delúbio Soares são de responsabilidade dele (Delúbio) e da direção do PT, de quem tinha conhecimento', insistiu. 'Não são de minha responsabilidade porque eu não acompanhava.' Nesse ponto ele foi enfático:

'Não participei da vida política do PT, da vida orgânica, administrativa, financeira. Não tenho responsabilidade sobre isso. Não fui comunicado, consultado'. Dirceu afirmou que a campanha de Lula em 2002 foi a primeira com um grande gasto, na ordem de R$ 40 milhões. 'Nenhum membro da executiva (do PT) pode vir a público e dizer ´o ministro Zé Dirceu telefonou, participou, sabia, concorreu pra essa ou aquela ação´ porque eu estava na Casa Civil.'

DESEQUILÍBRIO

Dirceu acredita que a saída dos grandes nomes do partido para o governo e o Congresso desembocou na crise petista. 'Talvez tenha sido um dos graves erros que eu cometi, não ter continuado acompanhando o PT. Talvez tenha sido um erro nosso sair tanto da direção do PT para o governo, não termos equilibrado melhor a participação na direção do PT e do governo.' Ele contou que nas reuniões do diretório nacional do PT 'prestava contas das ações do governo' e em seguida se retirava. Mas credita isso à sua agenda como ministro, função na qual, 'além de cumprir as missões' rotineiras, acumulou por 13 meses as funções de articulação política do governo. 'Vamos fazer justiça a mim pelo menos nisso.

Eu trabalhava 14 horas por dia, toda a mídia sabia disso e acompanhava.' Para se defender do que chamou de 'julgamento político' praticado contra ele, Dirceu recorreu à sua trajetória política. 'Tenho 40 anos de vida pública, São Paulo me conhece, o País me conhece', afirmou.

O deputado se disse vítima de uma inversão processual no Brasil, onde 'quem está sendo acusado é culpado até que provem o contrário'.

No entanto, o ex-ministro reconheceu que como homem público e vivendo em uma democracia, não só está sujeito como deve se submeter a julgamento dos órgão públicos e da sociedade. 'Não tenho nenhum constrangimento em me expor, em responder, porque senão eu iria plantar alface.'

Sobre as denúncias contra seu filho, Zeca Dirceu, acusado de tráfico de influência no Paraná em 2003 e 2004, Dirceu disse também que nada irregular foi comprovado: 'É mais uma perseguição política'.