Título: Morre perito do caso Celso Daniel
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/10/2005, Nacional, p. A7

Está morto Carlos Delmonte Printes, de 55 anos, legista que atestou marcas de tortura no cadáver de Celso Daniel, prefeito do PT em Santo André. 'Morte suspeita', registrou a polícia de São Paulo. 'Está descartada a hipótese de assassinato', declarou Domingos Paulo Neto, veterano delegado, diretor do Departamento de Homicídios, que vasculhou por cinco horas o escritório onde Delmonte foi encontrado, caído no chão. Não havia sinais de tumulto no imóvel, nem de violência aparente na vítima. Havia o corpo e uma carta. A polícia crê em 'morte natural', mas não elimina o suicídio porque há indícios de que ele planejava esse fim. O que aponta para isso é a carta que o morto deixou, quase um testamento de punho próprio em várias páginas, onde pede providências sobre a cerimônia fúnebre - queria ser cremado -, a preocupação em avisar familiares e a divisão de algumas economias guardadas no banco.

Um filho morto no trânsito e outro acometido de grave doença eram um tormento em sua vida. Andava angustiado. Travava uma luta desigual com a depressão. O coração enfraquecido também o incomodava. Há uns dois meses, desde que fez um curso na Swat, a superpolícia americana, uma gripe muito forte o abalou. Veio a pneumonia e, depois, miocardite.

Era reconhecido como um perito inflexível e metódico, como quase todos da sua ordem. Em setembro, fez depoimento explosivo à promotoria que esmiúça o assassinato de Daniel.

Reclamou ter sido censurado pelos superiores quando apontou crueldade na morte do prefeito. Recentemente, montou seu gabinete particular no 17º andar do Edifício Saint Paul, à Rua Botucatu, 591, Vila Mariana. Ali, passava horas isolado - lendo, estudando, trabalhando, que eram seus hábitos prediletos. O escritório, de fundos e sem requintes, tem um banheiro e duas salas. A maior é mobiliada com uma mesa e um cofre.

A outra é quase um quartinho - ali morreu Delmonte, ao lado de sua maior paixão, os livros. Havia pilhas, pelo chão e sobre a mesa, obras sobre Direito e Medicina Legal e romances.

Ontem, ele chegou ao prédio às 3h40, informou o filho Guilherme. O circuito fechado de TV mostra o legista entrando no Saint Paul, desacompanhado. Quando amanheceu, Guilherme ligou para o pai, que não atendeu. O rapaz tentou outras vezes, sem resultado. Intrigado, foi até lá por volta de uma da tarde e encontrou o corpo. Delmonte estava de cuecas. Os peritos da polícia verificaram que ele se havia barbeado.

'Ele estava com um quadro gripal, que evoluiu para pneumonia e acabou em miocardite, inflamação grave que pode tê-lo levado à morte', disse Paulo Neto, chefe da investigação. 'Não tem nenhum sinal de violência no corpo. Nada foi roubado. A princípio, não é quadro de assassinato.' Seu relato tem o reforço dos parentes, a ex-mulher e a atual, que são médicas.

Os agentes levaram o cadáver para um procedimento ao qual Delmonte se dedicou praticamente a vida inteira - a necropsia. Os peritos vão examinar o colega e suas vísceras, para saber se ele ingeriu remédio em dose excessiva. 'Vamos investigar qualquer possibilidade', disse Paulo Neto.