Título: Crítica pública de Rodrigues a Palocci foi contida por Lula
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/10/2005, Economia & Negócios, p. B1

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva segurou uma explosão pública de insatisfação do ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, após a notícia do foco de febre aftosa em Mato Grosso do Sul. Segundo fontes do governo, Rodrigues tinha a firme intenção de criticar publicamente a área econômica do governo pela falta de recursos para o ministério. Também queria atacar os pecuaristas da região afetada porque estes teriam, algum tempo antes do ressurgimento do foco, se recusado a fazer um reforço de vacina para proteger o gado. O presidente, porém, pediu que ele não fizesse essas críticas em público.

Já há algum tempo Rodrigues vinha demonstrando insatisfação com a área econômica, comandada pelo ministro da Fazenda, Antonio Palocci, segundo relatos de interlocutores. Na semana passada, ele fez duras críticas às políticas de juros altos e câmbio sobrevalorizado, que têm prejudicado o setor agrícola.

A crise da aftosa acentuou a irritação de Rodrigues, e em Brasília chegaram a circular rumores de que ele pediria demissão. De acordo com as fontes, o ministro vinha dizendo em conversas reservadas que não se surpreenderia se aparecessem casos de aftosa diante da falta de dinheiro para o ministério fazer a vigilância dos rebanhos. No outro lado da Esplanada dos Ministérios, Palocci, que foi posto na linha de tiro quando o caso estourou, preparou sua defesa dentro do governo. Tentando se livrar da responsabilidade, ele apresentou ao presidente Lula dados mostrando que a Fazenda teria liberado R$ 50 milhões para a Agricultura, mas o ministério só teria gasto cerca de R$ 4 milhões na vigilância sanitária. Isso indicaria que o problema seria de gestão, e não de falta de dinheiro.

Apesar de pedir a Rodrigues para evitar críticas públicas aos pecuaristas de MS, segundo fontes do governo o presidente quer que os pecuaristas que não obedecerem rigorosamente às campanhas de vacinação sejam punidos, por exemplo, com interrupção de acesso a crédito público e outras sanções. Preocupado com as repercussões para as exportações brasileiras e especialmente interessado no mercado russo, que suspendeu a compra de carnes da região, o presidente Lula deve conversar ainda esta semana pessoalmente com o presidente daquele país, Vladimir Putin, sobre o assunto.

De acordo com uma fonte ouvida pelo Estado, o governo entende que o surgimento de aftosa em MS não pode ser atribuído a um único fator ou ter apenas um culpado. Seria decorrente de uma sucessão de erros acumulados, que resultaram no problema enfrentado hoje pelo País. Além da dificuldade da Fazenda em liberar dinheiro e da Agricultura em executar seu orçamento, existiria a leniência dos Estados e a precária fiscalização das fronteiras, especialmente com o Paraguai.

Também pesaria, segundo essa fonte, uma 'cultura da malandragem' que ainda é prática comum de muitos pecuaristas. Para economizar, eles relutam em vacinar seu rebanho ou não se cercam dos cuidados para eliminar riscos de contaminação.