Título: Euforia no gabinete de Lavagna
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/10/2005, Economia & Negócios, p. B3

No Ministério da Economia, o clima era de final de Copa do Mundo com a classificação de risco argentina ante a brasileira

O clima ontem no Ministério da Economia era como o de uma final de Copa do Mundo. A expectativa era se ¿ pela primeira vez em seis anos ¿ a Argentina finalmente conseguiria ter um risco inferior ao do Brasil e, assim, tornar-se mais atraente que o país vizinho para os investidores internacionais. No meio da tarde, os assessores do ministro Roberto Lavagna ficaram eufóricos ao ver que o índice argentino havia caído para 342 pontos, enquanto o do Brasil era de 343. Mas, no fim da jornada, o índice argentino ficou em 343 pontos e o brasileiro em 341. Mas não havia clima de derrota, porque o risco argentino tem ficado perto do brasileiro. Para o Brasil, esse ¿sucesso¿ do seu vizinho causa perplexidade, já que este país, de turbulento passado político e financeiro, deu em dezembro de 2001 um calote de dimensões sem precedentes, de US$ 100 bilhões. No início deste ano, o presidente Néstor Kirchner aplicou à dívida com os credores privados uma drástica amputação, reduzindo seu valor em mais de dois terços. De quebra, ficaram de fora 20% dos credores. Em Buenos Aires, os analistas comentam: ¿O calote é passado. Os investidores preferem olhar para o futuro¿. Segundo Mariano Lamothe, economista de Abeceb.com, ¿o risco país medido pelo JP Morgan soma os bônus pós-calote. É um mercado `forward looking¿, ou seja, olha o que vai acontecer daqui para a frente. E, no futuro, o que se pode enxergar é que a Argentina será um país sustentável, que fechará este ano com uma fácil colocação de dívida nova, com um orçamento que suporta altos superávits fiscais. E os títulos são novos, não são mais os do calote¿. Além disso, prossegue, ¿ao contrário do que se esperava o país fez com sucesso colocações de novos títulos. A única exceção foi a última colocação, mas que se deveu à teimosia do ministro Lavagna em não aceitar as taxas de juros que o mercado pedia¿. O economista admite que a sorte do país é que os mercados olham para o futuro. ¿Se a Argentina fosse medida com outros índices, que levassem em consideração os anos anteriores, aí perderíamos de goleada do Brasil¿, afirma. Além disso, o governo Kirchner mostra uma tranqüilidade política que o Brasil não exibe com generosidade. Daqui a três semanas a Argentina terá decisivas eleições parlamentares, que definirão o mapa do poder pelos próximos dois anos. Segundo as pesquisas, Kirchner tem amplas chances de obter uma vitória de peso, que o deixaria próximo de alcançar maioria absoluta no Parlamento. Se esta vitória for significativa, ele poderá aspirar à reeleição presidencial em 2007. Isso assegura aos mercados que apesar das bravatas que costuma lançar contra os organismos financeiros e o capital estrangeiro, Kirchner permaneceria com sua política de superávit fiscal e de pagamento da dívida.